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sábado, 6 de julho de 2013

Vinicius, 100 anos. Roberto Muggiati escreve para a revista The President e conta os bastidores de uma farra com o poetinha em Paris

Reproduçãio Revista The President
Memória
por Roberto Muggiati (especial para a revista The President)

Eterno enquanto 100
Sou um labirinto em busca de uma saída.” O poeta sabia mais de si do que qualquer outro. Na verdade, Vinicius de Moraes passou a vida tentando sair de labirintos. Sua intensidade existencial abreviou seu tempo, mas legou um grande poeta. Carlos Drummond de Andrade admitia: “Eu queria ter sido Vinicius de Moraes. Foi o único de nós que teve vida de poeta, que ousou viver sob o signo da paixão”. O mundo literário sempre desconfiou dos poetas de êxito popular. Vinicius é estigmatizado até hoje por esse preconceito. Mesmo amigos como João Cabral de Melo Neto e Rubem Braga tentaram demovê-lo do que consideravam um “desvio” na sua carreira. Em 1977, numa entrevista à penúltima mulher, a argentina Marta Rodriguez Santamaría, para um livro que nunca foi publicado, Vinicius lamenta não ter composto uma obra-prima como o Bateau Ivre, de Rimbaud, Os Cantos, de Ezra Pound ou The Waste Land, de T.S. Eliot.
Nascido na Gávea, no Rio de Janeiro, 100 anos atrás, ele cresceu em meio à poesia e à música: o pai, funcionário público, escrevia poesia e tocava violino; a mãe tocava piano. O avô paterno era latinista e poeta, a avó fazia versos. O bisavô paterno era um excêntrico que, ao se aposentar, passou a caçar as empregadas; rechaçado pela mulher, foi dormir sobre o muro da casa até cair e morrer. A família também tinha muitos boêmios e seresteiros. Fiel ao sangue, Vinicius começou a poetar cedo, aprendeu violão e, no Colégio Santo Inácio, formou um conjunto com três colegas, os irmãos Tapajós. Letrista, compôs aos 14 anos suas primeiras músicas: “Canção da Noite” e o fox-trote “Loura ou Morena”. Aos 25 anos, ganhou uma bolsa para estudar língua e literatura inglesa em Oxford, onde casou por procuração com Beatriz Azevedo de Melo, que ficaria conhecida como Tati de Moraes. O início da guerra, em 1939, o traz de volta ao Brasil, onde nascem os primeiros filhos: Susana (1940) e Pedro (1942). Vinicius sempre balizou os sentimentos familiares pela poesia. Sobre a paternidade, compôs o irônico “Poema Enjoadinho”: “Filhos... Filhos?/Melhor não tê-los!/Mas se não os temos/Como sabê-lo?” Sua filosofia do amor foi magistralmente definida no “Soneto da Fidelidade”, dedicado a Tati: “Eu ... “Eu possa me dizer do amor (que tive): que não seja imortal, posto que é chama, mas que seja infinito enquanto dure”
O poeta no seu labirinto
Aos 30, entrou para a carreira diplomática e, três anos depois, assumiu o posto de vice-cônsul em Los Angeles. O casamento com Tati não é eterno, mas até que dura, para os padrões do poeta: 11 anos. Foi interrompido por um segundo e breve “casamento” (em cerimônia secreta numa igreja de Petrópolis), com Regina Pederneiras. Arquivista do Itamaraty, Regina levou de lembrança a “Balada das Arquivistas”. Em 1951, o Poetinha conhece Lila Bôscoli, numa boate de Copacabana, em episódio célebre. Rubem Braga teria dito: “Vinicius de Moraes, apresento-lhe Lila Bôscoli. Lila Bôscoli, apresento-lhe Vinicius de Moraes. E seja o que Deus quiser”. É paixão fulminante. Vinicius tem o dobro da idade, o irmão da moça, Ronaldo Bôscoli, quer lhe dar uma surra, mas se desmancha ao encontrar o poeta, seu ídolo. Vinicius tem duas filhas com Lila, Georgiana (1953) e Luciana (1956), e dedica à mulher o “Poema dos Olhos da Amada”. Apesar de toda a paixão por Lila, Vinicius se apaixona perdidamente em Paris por Mimi de Ouro Preto, manequim de Dior. Quando ela o rechaça, Vinicius se tranca na cozinha, veda todas as frestas e abre o gás. Por sorte a mãe de Lila Bôscoli chega mais cedo e salva o poeta de sua melancólica tentativa de suicídio. Rubem Braga e Vinicius se apaixonavam à toa. A diferença é que Rubem só casou uma vez e ostentava orgulhoso uma placa no seu famoso jardim suspenso de Ipanema: “Aqui vive um solteirão feliz”. Já Vinicius casava com todas. Em 1957, entra em cena Lúcia Proença, sobrinha do mentor de Vinicius, o escritor Octávio de Faria. Perderam a conta? É a quarta mulher oficial do Poetinha, que a brinda com “Para Viver um Grande Amor”. Começa àquela altura outra série de casamentos: as uniões paralelas de Vinicius com seus parceiros musicais. O primeiro é Tom Jobim: no Bar Vilarino, no centro do Rio, ele recebe a proposta de Vinicius: “Você toparia musicar minha peça?” E Jobim: “Tem um dinheirinho nisso?” (Como o Poetinha, Tonzinho também era chegado a um diminutivo.) Os dois compõem praticamente todas as canções da trilha de Orfeu da Conceição, peça de Vinicius que transplanta o mito grego para o morro carioca. O sucesso é tanto que o diretor francês Marcel Camus vem ao Rio filmar Orfeu Negro, que venceria a Palma de Ouro em Cannes (1959) e o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro (1960). Em 1961, surge um novo parceiro, Carlinhos Lyra. Vinicius compõe com ele canções como “Você e Eu”, “Minha Namorada”, “Coisa Mais Linda”, algumas delas incluídas no musical Pobre Menina Rica, baseado numa peça do poeta. Por ser letrista, o Poetinha se vê excluído do boom da bossa nova nos Estados Unidos, a partir do LP Getz/Gilberto, gravado em 1963. Afinal, a penetração no mercado internacional exige letras
em inglês, daí “The Girl From Ipanema” (ou “The Boy”, quando cantado por mulheres), “No More Blues” (“Chega de saudade”) e “How Insensitive” (“Insensatez”). Talvez por isso, Vinicius passa a in vestir mais na sua voz, aparecendo com destaque no LP Vinicius & Odete Lara. Gravado em 1963, é a estreia em grande estilo da nova parceria com Baden Powell, incluindo clássicos como “Berimbau”, “Só por Amor”, “O Astronauta”, “Samba da Benção” e “Samba em Prelúdio”, sobre o qual Vinicius disse a Baden: “Camaradinha, acho que plagiamos Chopin”. Vinicius participa da maioria das faixas e convence como “cantor-sem-voz”; aliás, iniciou-se nessa categoria dois anos antes do parceiro Tom. Na parceria com Baden, Vinicius abre seu leque musical para “coisas” da Bahia, com candomblé, berimbau, capoeira e samba de roda. Carlos Lyra foi peça fundamental para o casamento seguinte de Vinicius, o quinto. O Poetinha, aos 50 anos, apaixonou-se por Nelita de Abreu Rocha, 20 anos. Ela tem um noivo passional que ameaça matá-la caso a perca para outro. Carlinhos propõe – e planeja – uma fuga, pura e simples. Vinicius na época é designado para o consulado brasileiro em Paris. Com Tom Jobim ao volante, apavorados com as ameaças do ex-noivo, que é exímio atirador, Vinicius e Nelita pegam um carro para o Aeroporto do Galeão. Fernando Sabino e Otto Lara vão como seguranças. Antes de entrar no avião, Nelita deixa uma carta para os pais comunicando seu “casamento”. Ela parte toda vestida de branco, até calcinha e sutiã, uma verdadeira noiva. Diante do fato consumado, os pais tornam público num anúncio de jornal o casamento da filha com o poeta e diplomata Vinicius de Moraes. Um dia, uma amiga comenta sobre o fato: “O pior que pode acontecer é ele escrever para você meia dúzia de poemas e você se tornar famosa”. Inspirado por Nelita, Vinicius publica, em 1966, “Para uma Menina com uma Flor”. Mas, ao cabo de cinco anos, a menina vê mais garrafas do que flores no convívio com o poeta e desiste.
“Vate 69”
Todo um folclore cerca a relação de Vinicius com o uisquinho, diminutivo apenas no chamamento afetuoso, mas um problema enorme. Ele define a bebida como “o cachorro engarrafado,” o melhor amigo do homem. Raramente é visto sem um copo na mão, principalmente durante os shows. Adora o apelido “vate 69”, criado a partir de uma marca de scotch, o Vat 69. (“Vate”, o dicionário ensina às novas gerações, quer dizer “poeta, versejador, e também profeta, vaticinador, vidente.” Já 69, todos sabem o que é...) O apelido sugere o lema “sexo, bebida e bossa nova”. Apesar da dependência alcoólica crescente, Vinicius cresce como compositor e cantor e ainda como showman, lotando teatros no Brasil, em Roma, Paris, Lisboa e Buenos Aires. Impossível conciliar tudo isso com a carrière. Na onda de demissões no quadro diplomático que se segue ao AI-5, Vinicius é sumariamente exonerado. Em entrevista publicada postumamente pela Veja (12 de janeiro de 2000), o ex-presidente João Baptista de Oliveira Figueiredo explicou: “Eu era o chefe da Agência Central do Serviço e recebíamos constantemente informes de que ele, servindo no consulado brasileiro de Montevidéu, ganhando 6000 dólares por mês, não aparecia por lá havia três meses. Consultamos o Ministério das Relações Exteriores, que confirmou a acusação. Verificamos que ele não saía dos botequins do Rio de Janeiro, tocando violão, se apresentando por aí, com copo de uísque do lado. Nem pestanejamos. Mandamos brasa”. Vinicius ficou indignado com o ato arbitrário, mas manteve o bom humor. Corre uma anedota: quando circulou que a degola atingira homossexuais, corruptos e bêbados, Vinicius, ao chegar repatriado no Galeão, gritou do alto da escada do avião para a chusma de jornalistas: “Rapaziada, eu sou alcoólatra!” Os arquivos oficiais mostram que Vinicius, quando trabalhava, era um funcionário eficientíssimo. Mas ele abominava a ideia de chegar ao nível máximo da carreira, como disse em depoimento ao Museu da Imagem do Som, no Rio, em 1967: “Nos escalões inferiores da carreira, ninguém presta atenção em você. O perigo é você virar embaixador, né? Minha grande luta no Itamaraty tem sido para não ser promovido”. Ironicamente, em 16 de agosto de 2010, o governo promoveu postumamente “o diplomata, poeta e compositor Vinicius de Moraes ao cargo de Ministro de Primeira Classe (Embaixador).” O Poetinha deve ter tremido no túmulo. Se o AI-5 desencadeia “os anos de chumbo” na vida política, na vida conjugal de Vinicius ele traz os “anos de estanho”. Em represália a uma infidelidade do poeta, sua sexta mulher, a jornalista Cristina Gurjão, grávida de Maria (1970), quinta e última dos filhos do poeta, ataca Vinicius com dois candelabros de estanho. O foco dessa crise foi a baiana Gesse Gessy, filha de santo que será a sétima mulher de Vinicius. Gesse faz a cabeça do marido e o leva ao terreiro de candomblé da Mãe Menininha do Gantois, em Salvador. Vinicius tinha medo de avião desde um episódio em 1945: voava do Rio a Buenos Aires quando o hidroavião francês fez um pouso forçado numa laguna uruguaia; a hélice invadiu a cabine como uma serra voadora e matou um passageiro a poucos metros dele. Mãe Menininha o libera do medo de voar em troca de certas obrigações: só veste roupas brancas, cobre-se de colares de contas e de conchas, deixa os cabelos crescerem até os ombros e cumpre uma série de rituais toda vez que vai subir num avião. No livro Nuestro Vinicius/ Vinicius de Moraes en el Río de la Plata (Editora Sudamericana, 2010), a jornalista Liana Wenner narra a sequência da história. Apresentando- -se no início dos anos 1970 com Maria Creuza e Toquinho na boate La Fusa de Buenos Aires e Punta del Este, Vinicius torna-se um verdadeiro ídolo na Argentina. Mas os hermanos não engoliam Gesse. O produtor de discos de Vinicius mencionou “a cagada que ele fez ao se casar com a baiana”, afastando amigos até como Tom Jobim. Outro empresário cultural alfinetou: “Trazia do Brasil ovos de codorna em escabeche, aqui raríssimos na época, porque dizia que eram bons para a virilidade — ela era assim...” Liana Wenner bota a pá de cal: “Ficaram para trás as roupas pretas que Buenos Aires conhecia. Por Gesse, Vinicius foi astutamente levado a um coquetel vulgar, confuso e superficial de hippismo, candomblé, amor livre e quantos ‘ismos’ dernier cri se cruzassem”. Vinicius saía sempre dos casamentos com uma escova de dentes e seu retrato pintado por Portinari em 1938, quando o poeta tinha 25 anos. Desta vez, para recuperar a tela teve de entrar na Justiça contra Gesse. Depois de um espetáculo, uma jovem fã procurou Vinicius para lhe mostrar alguns poemas que escrevera. Era inevitável: a oitava e penúltima mulher de seria uma argentina Martita.
Alarga-se a defasagem etária para 38 anos: ele tinha 61, ela 23 – era doze anos mais moça do que Susana, a primeira filha do poeta. No Rio, Martita foi apresentada aos cinco filhos de Vinicius – jovens como ela, excetuando Maria, com cinco anos. Ela o acompanha no circuito universitário pelo interior de São Paulo e depois na turnê por Portugal, França e Itália. Apaixonado, Vinicius complementa sua educação, apresenta-a aos grandes escritores, artistas e músicos, vivos e mortos. Dedica a ela um poema bem humorado: “A mulher de gêmeos/Não sabe o que diz/Mas tirante isso/ Faz o homem feliz.” Casam-se em 1976, mas, segundo Liana Wenner, será “uma relação feita de despedidas e reencontros.” Durante as turnês pela Europa, Vinicius é assessorado por Gilda Matoso, que será sua nona e última mulher. Apesar de quarenta anos mais moça, Gilda procura colocar o poeta no prumo e lhe traz uma maturidade que ele jamais alcançou. Instalam-se numa casa na Gávea onde Vinicius intensifica sua parceria com Toquinho e as prolongadas sessões à banheira, seu verdadeiro escritório. Segundo a amiga Renata Shussheim, “fazendo banhos de imersão, colocava entre as bordas da banheira uma prancheta que usava como mesinha e ali escrevia. Passava horas assim, eu o apelidei de Moby Dick”. A atriz Alexia Deschamps, ainda criança, foi com a mãe visitar Vinicius e o encontrou na banheira. Até hoje diz em tom de brincadeira: “O primeiro homem nu que vi na vida foi Vinicius.” E foi na água (ele a comparava a “uma volta ao útero materno”) que o Poetinha viveu seus últimos momentos. Vinicius foi encontrado inconsciente pela empregada na manhã de 9 de julho de 1980. Tentaram reanima-lo em vão e ele morreu nos braços da última companheira, Gilda Matoso, e do último parceiro, Toquinho. Fechava um ciclo, antes de completar 67 anos, e morria – depois de longas andanças pelo mundo – no mesmo bairro onde nasceu. O poeta saía finalmente do grande labirinto que foi sua vida.
Saravá,
Vinicius de Moraes!
Reprodução Revista The President


O meu Vinicius 

por Roberto Muggiati (especial para a revista The President)
“Conheci Vinicius, ou melhor, trombei com ele, na noite da estreia
brasileira de Sarah Vaughan: 6 de agosto de 1959, uma segunda-feira. Foi na boate Fred’s, que ficava em cima de um posto de gasolina na Avenida Atlântica, esquina da Princesa Isabel. O tout Rio marcou presença, a mesa principal presidida pelo capitão da mídia mais poderoso da época, Samuel Wainer, com sua Danuza. Decorando a mesa, os “pombinhos” recém-casados João e Astrud Gilberto. Vinicius e um batalhão de jornalistas, do qual eu fazia parte, disputávamos a atenção da diva no seu camarim. Eu, repórter curitibano, com quase 22 anos; ele, colunista famoso, com quase 46 – ambos librianos de 6 e 19 de outubro. Claro, não fui páreo para o Poetinha, que já se projetava como o letrista maior da bossa nova. Aquela noite foi “o último baile da Ilha Fiscal” do Rio de Janeiro como Capital da República. Em menos de um ano, a cidade passaria à condição de capital de um factoide, o estado da Guanabara. Meu segundo encontro com Vinicius foi bem mais prolongadoe próximo. No dia 1º de julho de 1964, quarta-feira, um trio de amigos deixou Londres com a missão precípua de visitar o Poetinha em Paris: Fernando Sabino, adido cultural do Brasil em Londres; o jornalista Narceu de Almeida, ao volante do seu Morris Mini-Minor; e eu, radialista da BBC. Narceu e eu éramos meros coadjuvantes: o grande amigo de Vinicius era Sabino. Num dia esplendoroso de verão, deixamos para trás a verdejante paisagem inglesa, atravessamos de ferry o Canal da Mancha e, por entre infindáveis campos de girassóis, chegamos a Paris. Não me lembro como – sem celular – descobrimos o local exato onde encontrar o poetinha. Embora já passasse das nove da noite, raios dourados de sol ainda banhavam a copa dos castanheiros. E lá estava outro trio, no La Feijoada, em seu primeiro endereço parisiense, num cais da Île Saint- Louis. Um trio bem mais carismático: Odete Lara, Baden Powell e Vinicius. Começou aí uma sucessão de quatro noites de loucas conversas regadas a uísque. Em outra ocasião, fomos beber num bar do qual Vinicius era praticamente sócio, Le Calvados. Mas a grande noite foi mesmo na sexta-feira, no apartamento do Poetinha. Um apartamento térreo num daqueles prédios típicos do seizième, nas cercanias do Champs- Elysées, quase sem decoração, embora Vinicius representasse o consulado do Brasil em Paris. Uma vez iniciados os trabalhos etílicos, sua mulher, Nelita – 30 anos mais moça – se recolheu para dormir. Ao longo da noite, toda vez que um marmanjo precisava ir ao banheiro, se via obrigado a passar literalmente por cima de Nelita, apagada na cama de casal que tomava todo o quarto. Falou-se muito – principalmente Vinicius e Sabino, que passaram mais de duas horas discutindo Jayme Ovalle. Bebeu-se muito, também confesso – que quase nada lembro. Uma só imagem gravei fotograficamente: lá pelas 5 da manhã, com o sol querendo já se mostrar, pela janela do rez-dechaussée aberta para a rua, entram duas fadas, Odete Lara e Mylène Demongeot. (Vinicius sempre se cercou de belas mulheres.) Mylène esbanja meia hora de charme e sexappeal antes de se despedir: “Bem, preciso ir embora. Na França, se a gente chega em casa depois das 6 da manhã, quer dizer que dormiu fora...” Lembro-me do ar extasiado com que o Poetinha sorveu a bela sonoridade da frase enunciada pelos lábios carnudos de Mylène: “Ben, je dois partir. En France, si on arrive chez soi après six heures, ça veut dire qu’on a découché”.”