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segunda-feira, 9 de junho de 2014

Comary 2014 não é São Januário 1950 mas clima na seleção brasileira é de badalação e agito. Se vai dar certo, nem Felipão sabe...

por BQVManchete
Em 1950, às vésperas da decisão da Copa, a seleção estava concentrada na Casa dos Arcos, no Joá, cedida pelo empresário Drault Ernani. Flávio Costa, o então treinador, contou ao jornalista Paulo Perdigão (no livro "Anatomia de uma Derrota") que "as noites no Joá estavam sendo perturbadas pelas pessoas que passavam, atiravam pedras, gritavam, iam cantar, faziam serenatas, essas coisas". Flávio decidiu então levar todo mundo para São Januário onde, imaginava, a seleção teria mais privacidade. Foi pior. Além da romaria dos políticos (1950, como 2014, era um ano eleitoral), era mais difícil controlar o acesso. Imprensa, diretores, sócios, convidados da CBD, da federação e de beneméritos dos outros times que tinham jogadores na seleção entravam e saiam do estádio do Vasco. Rádio era um meio poderoso na época, como a TV é hoje. No dia do jogo, os craques foram acordados às sete da manhã para assistir a uma missa promovida por uma emissora que estava sendo inaugurada. Durante o dia, como se fosse foco de uma romaria, a seleção recebeu caravanas de torcedores, deu autógrafos, ouviu discursos. Nada disso, segundo Perdigão, foi noticiado pelos jornais. O Globo do dia 15 de julho de 1950 publicava apenas: "São Januário está como que isolado do mundo. Nem mesmo à entrada do estádio há movimento (...) em São Januário a atividade é absolutamente normal, como se nada tivesse acontecido de extraordinário há muitas e muitas semanas". O repórter autor dessas falsas linhas certamente nem ao estádio foi. Deve ter batucado a ficção na sua Remington sem tirar os pés da redação. Só após a derrota para o Uruguai, os jornais passaram a publicar as queixas dos jogadores sobre o clima insuportável que cercou a seleção nos treinamentos no Rio. Mas aí os boleiros já não foram levados a sério, suas críticas caíram no vazio. Com a derrota, de assediados e paparicados antes do fatídico gol de Ghiggia tornaram-se "malditos", quase invisíveis. Até poucas horas antes de irem para o Maracanã, os brasileiros sofriam com a badalação dos visitantes. Enquanto isso, os uruguaios se hospedavam tranquilamente no hotel Paissandú, no Flamengo. Alguns jogadores chegaram a arriscar uma caminhada na orla e se deixaram ficar por alguns momentos sentados, conversando, na mureta que beirava o mar antes da construção do Aterro.
A midia noticia hoje que o clima em Comary é de festa. Os jogadores fazem questão de ficar junto da torcida, analisam. Os jornais chamam de torcida mas não é bem assim. Basta ler as matérias para constatar que a torcida mesmo ficou do lado de fora, limitou-se a aplaudir os jogadores quando estes passavam de ônibus e a ver o treino de longe. O que a mídia chama de "torcida" seriam convidados dos patrocinadores, filhos e sobrinhos de jornalistas, câmeras e fotógrafos que cobrem a seleção, equipes que gravam programas de TV, parentes de jogadores, dirigentes e amigos de dirigentes. Uma informação: há 800 jornalistas credenciados para cobrir os treinos da seleção brasileira e, a partir de ontem, todos os credenciados pela Fifa poderão ter acesso a Comary. Tem tudo para piorar. 
Se desse uma passadinha na concentração Garrincha, que tinha que pular o muro, coitado, quando estava cansado de ver marmanjo e queria dar uma escapada, ia estranhar a moleza. Há cercadinhos vips para celebridades assistirem aos treinos. Parentes dos jogadores também já fizeram parte dessa plateia pelo menos uma vez com direito a gritinhos de apoio. Dançarinas de funk da "Jaula das Gostozudas" adentraram o recinto para tentar entregar um CD ao Neymar. Obviamente, destaca-se hoje nos jornais e nos sites apenas a cena "emotiva" de uma criança que "invadiu" o campo e que Neymar impediu que os seguranças retirassem. Ok, de chorar. Mas bola pro mato que o jogo é de campeonato.  Nada contra que o clima seja de festa, mas dá para guardar um pouco para depois que botar a mão no caneco? Seleção mais "humana" (antes era desumana?), "aconchego" (tente imaginar Brito e Fontana, em 70, Belini e Vavá em 58, Dunga e Romário em 94 pedindo... "aconchego"). Ô, família Felipão, cuidado aí com essa "carência emocional": Messi e Balotelli, por exemplo, não são de dar aconchego a ninguém. 

Preocupante também a informação de que a Seleção treinou ontem em um campo pequeno. O motivo seria comercial. O campo maior onde o time de Felipão vinha jogando teve trocadas suas placas de publicidade. A Fifa assumiu Comary e instalou os patrocinadores oficiais da Copa em lugar das marcas que bancam a seleção brasileira. Por não querer pôr azeitona na empada dos  concorrentes, a CBF teria transferido o treino para um campo menor mas sem placas. É só uma "ação de marketing", Felipão que se vire. Dizem que o treinador já está reclamando, identifica excessos na badalação. Resta esperar que sua voz seja ouvida. Que ele seja o último a deixar que seu trabalho seja prejudicado. 
De qualquer forma, as cenas em Comary contrastam com as primeiras imagens dos treinamentos das outras seleções. A Holanda, por exemplo, está se exercitando na Gávea. Em paz. Até o campo está cercado de tapumes e placas. A Inglaterra fará parte do seu treinamento na Escola de Educação Física do Exército, na Urca. É área militar. "Gostozudas" inglesas, se aparecessem, seriam barradas. Há times, como a Rússia, no interior de São Paulo, outros em praias afastadas na Bahia. 
Que façam bom proveito da calmaria que a seleção brasileira não tem, mas, por favor, evitem gerar um novo e dessestreessado Ghiggia.