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segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Anotações de viagem-3: Londres, verão nota 10

por Lenira Alcure
Acabo de copiar uma citação de Proust afixada num cartaz em frente a uma igreja Unitarian ( não sei o que é isso) em Notting Hill Gate: “A viagem mais importante não é a que se faz descobrindo novas terras, mas aquela em que abrimos os olhos para o mundo perto ou longe,de uma nova maneira”. Mme de Stael, que viveu entre os sécs 18 e 19, escrevia suas impressões da Itália com a mesma idéia, a de que uma paisagem vale a pena pelo que aprendemos da presença humana ali. Sem pretensões de chegar a esses ilustres imortais, meu bisavô Chiquinho~aconselhava às filhas (13!): “A educação de uma moça só está completa quando ela viaja!” Guardei a lição e minhas viagens sempre tiveram razões muito pessoais, algo com antigas paixões que assim vão sendo alimentadas. No ano passado, fui a Reims, completando meu circuito Joana d’Arc, cuja história toda ilustrada li aos 9 anos, meu primeiro livro em francês. Em 1970, fui a Grécia graças às aulas do Prof. Junito, na PUC. A Istambul, fui motivada pelo quadro que herdei da minha bisavó Lissinha e que hoje está na minha sala. Em 1990. atravessei a Dinamarca para ver a casa de Hans Cristian Anderson.
Dia 30 de julho
Meu verão europeu começou hoje, exatamente às 12:32, quando desci da estação do metrô de Leicester Square e pela primeira vez desde que saí do Brasil, senti calor. Dentro e fora da estação, uma grande quantidade de guichês ofereciam lugares de última hora para mais de 30 peças em cartaz. Fiz como todo mundo, uma fila entre muitas para tentar uma entrada para Mousetrap. Não havia lugares, só para segunda, no segundo upper circle, um balcão longe do palco, e sem direito ao desconto dos velhinhos. A própria vendedora me aconselha a procurar na bilheteria, o teatro ficava ali perto, just on the corner.
Por que logo a Mousetrap, 56 anos em cartaz? Por causa de Mrs. Bee Duffell ( não estou bem certa de tantas letras dobradas, but who cares?. Mrs Bee, a lovely old Irish woman has passed away already). Ela foi uma das velhinhas da peça nos anos 70, e também minha professora de inglês naquela época. Eu já havia voltado ao Brasil quando ela me enviou a Playbill que tenho até hoje, com o seu nome no elenco.
Back to London, 2011: não foi fácil encontrar o St Martin Theatre: de novo a história dos mesmos nomes em diferentes locais: são ruas, praças, ruelas, passagens, tudo St Martin, o que me fez andar em círculos, passando várias vezes pelo mesmo lugar até encontrar um bondoso gentleman, mais ou menos contemporâneo de Mrs. Bee, quem sabe até mesmo enviado por ela, e que me deu a indicação precisa. Cheguei. Há um lugar, fila D 15, melhor impossível, mas sem desconto, 41 libras. A do Upper Circle era 34! Não hesito. Agora é esperar até segunda, anoto as indicações para não me perder de novo.
Faz calor, o termômetro indica 24 graus, vou me desembaraçando das várias camadas de roupa. Em compensação, o peso da mochila aumenta. Saio leve e vou almoçar, num restaurante que me parece inglês. Mas o prato que escolho é francês, salmão sobre um risoto com aspargos, peço uma taça de rosé também francês, harmonia cromática com a comida.
Dali vou até London Bridge, procuro o Globo ou melhor The Globe, o teatro reconstruído como na época de Shakespeare. Nem tour, nem peça, tudo sold out. Compro entrada para uma palestra no domingo: “Read are not Dead”. Sigo o conselho da Laís e mais à frente, logo ali, entro na Modern Tate, onde está uma exposição de Miró.De quebra, aproveito a bela vista sobre o Tamisa do alto do prédio. Preciso voltar. Marquei com a Simone, que também foi aluna da PUC, em frente á estação de Convent Garden.
De novo, dou voltas e voltas, como na véspera: se entro por um lado e a saída é no outro, já não sei onde estou, perco as referências, meu fio de Ariadne se rompe. Duas moças me salvam, também estão indo ao Convent, vamos de ônibus. Encontro Simone e o fim de tarde é ótimo. Atravessamos para o outro lado do Tamisa, nós e uma festa de gente pelo sunny day. O panorama visto da ponte é maravilhoso, com a torre do Big Ben, e a silhueta da House of Parliament em contraste com o azul cobalto que vai tomando conta deste pedaço de céu londrino. Sentamos para um lanche, há música por toda parte, performances ao ar livre e outras, não, só para convidados, como a Vintage Party, que descobrimos nas roupas de época de alguns participantes.
Dublin que me perdoe. Mas Londres no verão é nota 10.

Anotações de viagem-4: Londres, teoria geral dos ovos...

por Lenira Alcure
Domingo, 31 de julho
Reflexões sobre a minha improvável Teoria Geral dos Ovos (rooms) Japoneses no Éden Plaza Kensigton, onde estou hospedada: parodiando Orwell, todos os ovos são iguais, mas alguns são mais iguais que os outros. Mudei para o quarto andar, com direito a janela. Continua um ovo, mas é um ovo aberto, com uma pequena janela sem vista para o parque, mas de todo modo menos claustrofóbico. Deram-me agora uma double, depois que eu reclamei da algazarra que me acordou cedo, vinda do maids room, ao lado. O ovo útero já não assombra mais. A cama é maior, mas o espaço ficou ainda mais apertado. Mas me arranjo bem, treinada desde o colégio interno quando dormia num quarto desse tamanho.
Estou indo a Candem Town. Amigos, me desculpem os fans, não vou procurar a casa da Amy Winehouse, para onde as procissões continuam fluindo. Pulo a pobre Amy, sigo direto ao Market. Hoje o dia está mais quente. Acho que faz 26º. Almoço em uma das barracas, na dúvida entre uma paella valenciana e um curry indiano. Acabo decidindo pela Índia, porque a vendedora é mais simpática: Namastê para ela.
O local é um point nos domingos, uma multidão se acotovelando, não resisto e compro uma mochilinha que dobra toda. Não sei se vai dar tempo para a palestra em O Globe, para a qual já comprei o ingresso ( 5 libras). A estação de metrô está fechada para a volta. E agora? Sofro a síndrome de abstinência do fio de Ariadne. A história li em criança, num dos livros de Monteiro Lobato: a namorada do Teseu deu a ele fio que desenrolado ao logo do percurso permitiu ao herói entrar e sair da caverna do Minotauro pelo mesmo caminho.
Descubro um ônibus que vai até Lancaster Gate. Mudo o programa: é para lá que eu vou. Tento achar o endereço onde morei, 49 Lancaster Gate. De novo, são milhares de LG, vou margeando o Hyde Park, hesito, retomo a caminhada. Finalmente, chego, está lá a antiga Casa do Brasil em Londres. Nenhum sinal de vida à porta. Tento o vizinho, um hotel no número 50. Pergunto se o 49 também faz parte do hotel. Não, ele me explica, são apartamentos particulares.Tiro fotos na frente do prédio. Sem saudosismo piegas, estou contente, é bom ter passado, lembrar os bons momentos ali vividos. Sem tristeza: good memories last for ever.
A alma leve como passarinho, pego um ônibus até Notting Hill Gate. Poderia ser Nothing Hill gate, porque não há nada lá. Tomo outro, na direção de Kensigton Gardens. Passo pelo Princess Diana Memorial Walk. Não, amigos, bypasso essa homenagem também. Desço em outro mais antigo, o Prince Albert Memorial , um tanto kitsch para o meu gosto, e em frente sigo para o Royal Albert Hall.
Nos anos 70, o local estava meio caidaço, explica a guia do tour para o qual consigo a última entrada disponível. Jovem e solta, ela contagia o pequeno grupo pelo entusiasmo. O Hall é todo ele magnífico, inaugurado pela rainha Victoria em homenagem ao príncipe Alberto, marido e príncipe consorte, morto aos 42 anos, de tifo (!!!). A reforma é dos anos 90 e ali acontecem concertos de todo tipo, dos clássicos aos mais modernos ( Beatles e Frank Sinatra já se apresentaram lá) e também eventos esportivos, espetáculos de dança e performances diversas.Em julho e agosto, o Hall recebe as BBC Promenades, com concertos de música clássica todos os dias. O de hoje é com uma Filarmônica da Rússia. Dos 5.220 lugares que o Hall comporta, mil são colocados á disposição de interessados no dia de cada concerto, por apenas 5 libras. 800 desses lugares na verdade ficam atrás das galerias, sem direito a assento. Obrigada, de pé nem sem pagar. Mas nós do tour assistimos a uma parte do ensaio, nas poltronas ao lado do camarote da Rainha. Os 26 parentes e convidados desse camarote devem seguir três regras: roupa de gala, nada de bebidas ou comidas, nada de dança, também. Mas -explica a guia- , o protocolo foi quebrado durante a visita do então presidente sul-africano Nelson Mandela. Ele apareceu sem gravata e quando a orquestra começou a tocar músicas africanas, não agüentou e dançou como sempre faz. Parece que, no inicio, a Rainha ficou impassível. Depois de algum momento, as royal mãos começaram a marcar o ritmo e daí a pouco, ela ondulava também, um modo elegante de permitir ao ilustre convidado a quebra do protocolo.
Faço um lanche na cafeteria do Hall, muito British e só aberto para quem tem conivite, no nosso caso, o ticket do tour (7,50 libras para seniors...). Dali sigo a pé, agora já sei onde estou, sigo a Queengate a partir do Parque, menos de 10 minutos e estou no hotel. Sai para jantar num restaurante libanês aqui perto. Volto, preciso dormir. Amanhã, terei muita coisas por fazer. Mas acho que agora só dou notícias do Algarve, ou quem sabe, no Brasil mesmo. Até mais.