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sábado, 14 de maio de 2022

Carlinhos (de) Oliveira, na aparente simplicidade...

Carlinhos [de] Oliveira - Rio, 1978 - Foto: Guina Araújo Ramos

por Guina Araújo Ramos (do blog Bonecos da História) 

Há algum tempo eu queria publicar esta foto nos Bonecos da História, não só porque a considero interessante, mesmo não sendo tão especial assim, mas principalmente porque retrata a transcendente e complexa simplicidade de quem, com tanta sutileza quanto acidez, observava a vida da cidade do Rio de Janeiro e do Brasil em meados do século passado.

Trata-se da foto do capixaba José Carlos Oliveira. Sugerindo a tal simplicidade, ele era mais conhecido (embora também o registrassem, talvez para dar ao nome uma sonoridade que correspondesse a seus textos, como Carlinhos de Oliveira) por, simplesmente, Carlinhos Oliveira.

Quer posso dizer sobre Carlinhos [de] Oliveira?... Não sou, de maneira alguma, conhecedor, ao menos razoável, de obra, mas mero leitor antigo e ralo, apenas do final dos seus 22 anos como cronista do Jornal do Brasil (de 1961 a 1983).

É evidente que sua obra precisa (e merece) forte ressurgência, que até parece começar a acontecer em espaços da Internet (que não sei o quanto são lidos): no Portal da Crônica Brasileira (do IMS), na cobrança de Ricardo Soares, no incômodo de Álvaro Costa e Silva na Folha, a resenha existencialista da revista digital Rubem e também em textos acadêmicos, especialmente sobre o livro Diário da Patetocracia, que reúne crônicas do ano de 1968 publicadas no JB.   

Ainda antes de ser meu “colega” no JB, fiz eu esta foto (à época, com o crédito Aguinaldo Ramos), que foi inserida dentro da entrevista, parte de uma muito sensível série da revista Fatos & Fotos assinada pelo jornalista Renato Sérgio, outro grande jornalista/cronista carioca.

A conversa aconteceu no apartamento de Carlinhos, no Leblon, em rua bem afastada da praia, em frente ao então quartel da PM. Os dois (e eu também) sentados na varanda apertada, em uma conversa tão descontraída (para mim, sentado no chão, algo desconfortável...) quanto a imagem que a ilustra.

Fatos & Fotos Nº 885, 07/08/1978 - Foto: Guina Araújo Ramos

Por valorizar ainda mais a foto, louve-se o trabalho da redação, que a Fatos & Fotos produzia edições gráficas altamente criativas (por exemplo, outra de que gosto muito, o uso de três fotos de Chico Anysio, em show no Canecão, que dá movimento quase cinematográfico à página impressa). 

Não por acaso, Fatos & Fotos foi dos lugares mais prazerosos em que trabalhei como fotojornalista.

O problema é que, estando “sumido” o arquivo fotográfico de Bloch Editores e ainda não digitalizada e disponível a coleção da revista (como já acontece com a revista Manchete na BN), a minha única fonte de recuperação da imagem foi o recorte da publicação original, guardada por mais de 40 anos, de onde “retirei” a imagem através do imprescindível Photoshop, coisa trabalhosa e de resultado certamente apenas razoável.

segunda-feira, 10 de junho de 2019

Alberto Dines, nossa longa vida pelas Redações dos jornais e a histórica primeira página do JB, sem manchete. Por Nelio Barbosa Horta

Alberto Dines no front jordaniano, em 1967, quando cobriu para Manchete a guerra no Oriente Médio.

Em 1962, no almoço de comemoração de um ano da revista Fatos & Fotos, ao lado de Austregésilo de Athayde, Juscelino Kubitschek e Adolpho Bloch


por Nelio Barbosa Horta 

Eu achava que o Dines ia chegar aos 100 anos. Era uma pessoa extremamente saudável. Extrovertido, criativo, feliz ao lado de sua companheira, a jornalista Norma Curi, que também foi do JB nos anos dourados. Confesso não pensei que nos deixaria antes do centenário, trazendo muita tristeza a todos que tiveram, como eu, a honra de trabalhar e conviver com ele na sua longa e brilhante trajetória pelos jornais e revistas brasileiros.

Conheci o Dines nos anos 50, no antigo Diário da Noite, jornal verde, cujo secretário era o Carlos Eiras (só os mais antigos se lembrarão dele), jornal do Paulo Vial Corrêa, do Austregésilo de Athayde, do Fernando Bruce, do Brício de Abreu, (o Briabre), do Marcelo Pimentel, do Nelson Rodrigues e que ficava na Rua Sacadura Cabral, 103.

Como o jornal enfrentava grandes dificuldades financeiras, apesar da grande equipe, o Dines foi contratado e transformou o DN verde em tabloide, numa desesperada tentativa de recuperá-lo. Conseguiu, já que houve momentos em que o novo tabloide triplicou a vendagem, coisa rara na época.

Deixando o DN, Dines foi ser editor da Fatos&Fotos, revista de Bloch Editores, onde seu brilhante espírito de liderança e competência se fez sentir, já que ele chegou a balançar e a concorrer com a tiragem da revista mais importante da Bloch, a Manchete. Naquela redação havia muita gente competente, o Macedo Miranda, o Ney Bianchi, o Itamar de Freitas, o Paulo Afonso Grisoli. Na Arte, o Ézio Speranza, eu e o Laerte Gomes. Trabalhei no Diário de Notícias, que tinha o José Carlos Oliveira, o Luiz Alberto, o Ascendino Leite, o Teixeira Heizer e tantos outros. Depois trabalhei na Folha da Guanabara, com o Rennée Deslandes.  Passei pelo Mundo Ilustrado, onde conheci o Hugo Dupin, pai do Fábio Dupin. Mais tarde, Tribuna da Imprensa, com o Hélio Fernandes e o Guimarães Padilha, em plena ditadura. Também trabalhei na precária cenografia da TV Tupi. Meu chefe era o Carlos Thiré, casado com a Tônia Carreiro e pai do Cecil Thiré. Quando saía, por volta das 23 horas, ia, a pé tranquilamente até o Largo de São Francisco pegar o bonde São Januário que me levava até São Cristóvão, onde morava. O Aterro ainda não existia...

Voltei a trabalhar com o Dines em 1º de maio de 1965, Dia do Trabalho, naquele lindo prédio da Av. Rio Branco, quando ele me convidou para o JB, para me juntar à equipe que ia fazer da edição de  domingo um “jornal diferente”, segundo suas palavras. Não havia vaga na Arte e eu fui ser repórter- especial . Meu chefe era o Aluizio Flores, o “Amiguinho” lembram dele?

 Como o JB estava em grande fase de expansão, o jornal se dava ao luxo de “exportar” profissionais, o Dines me mandou para a Gazeta do Povo, de Curitiba, para uma reestruturação gráfica e editorial. Fiquei lá por três meses. Muito frio, 16 horas de ônibus pela viação Penha, mas acho que o nosso trabalho foi reconhecido, apesar do jornal ter saído, naquele período, com a “cara do JB”.

Na volta para a Redação do JB encontrei grandes profissionais e editores: Wilson Figueiredo, Oldemário Touguinhó, Luiz Orlando Carneiro, Carlos Lemos, Gazzaneo, Joaquim Campelo, Humberto Vasconcelos, Macksen Luiz, Zózimo, Zuenir Ventura, Luiz Paulo Horta, Fleury, Regina Zappa, Bella Stall, Ana Arruda, Iesa Rodrigues, Rose Esquenazi, Sandra Chaves, Celina Côrtes, Léa Maria e tantos outros e outras, todos brilhantes profissionais.

Em 2004, participei da equipe que ganhou o último Prêmio Esso do JB com a 1ª página: Ministro Berzoíni: “ Eu odeio filas”. Na equipe, o Augusto Nunes, o Otávio Costa, o Marquinho e eu.

 Como eu trabalhava de dia em Bloch Editores só podia chegar ao JB à noite, às 18 horas, eu era o “fechador”, responsável pelas edições diárias. Eu ficava na primeira página junto com o copy-desk. Não tinha hora para sair, mas meu esforço era compensado porque o jornal, naquela época, já estava na Av. Brasil, próximo da subida da ponte. Eu morava em Niterói e subia a ponte rapidamente. Eu tinha uma Brasília que vivia enguiçando, quase sempre no vão central. Os funcionários já me conheciam e diziam: “outra vez seu Nelio...”, uma festa!

 Passei por todos os cadernos do JB, especialmente o Caderno Especial, cujo fechamento era às sextas-feiras, de madrugada. Era um super-pescoço e várias vezes eu amanhecia no jornal, esbarrando nos que chegavam para “abrir” as edições do fim-de-semana. Foram 46 anos, ininterruptos, até 2011, no Rio Comprido, já na edição digital.


A antológica capa do JB, em 12 de setembro de 1973
A famosa e histórica primeira página do SalvadorAllende ficou decidida bem tarde. O Dines e o Lemos já tinham deixado a Redação e a ordem da censura para que o jornal não desse manchete foi recebida pelo Maneco (Manoel Bezerra), que era o secretário da noite. O Maneco ligou para o Dines avisando da nova determinação da censura. O Dines chegou rapidamente à Redação e disse:
“-Vamos obedecer à censura, a página sairá sem manchete”.

A ideia da página sem manchete foi dele. Como o Avellar, (José Carlos Avellar) que era o diagramador oficial da primeira página já tinha saído, a “bomba” estourou na minha mão. Confesso que foi a página mais fácil de se fazer. Sem manchete, sem foto, apenas com o “L” dos classificados. Antes de tirar a manchete que seria, ‘Golpe derruba e mata Allende’... O texto, acho que foi a editoria internacional que mandou uma parte (Humberto Vasconcelos, que estava em Santiago) e o Lutero, que escreveu o restante, com a supervisão do Dines, e do Lemos, que àquela altura já haviam voltado ao jornal. Infelizmente, talvez tenha sido aquela página o “estopim” para a saída do Dines do JB.

Deve-se a Nelson Tanure a manutenção do jornal, primeiro impresso e depois “digital” e a Omar Catito Peres o relançamento, há pouco mais de um ano, do grande JB.

Agora, é só saudade. Dines, companheiro de tantas trincheiras, de tantas lutas, o mais completo jornalista do século passado, nos deixou aos 86 anos, em 22 de maio de 2018, há um ano.

Deus o abençoe e até qualquer dia.

quarta-feira, 17 de abril de 2019

Fotomemória - Serão as elites comunistas? O que Luiz Carlos Prestes diria sobre isso? Por Guina Araújo Ramos

Rio, 1980: Sozinho, Prestes deixa a sede da Polícia Federal após depoimento. Ele embarca em um Fusquinha, o táxi da época. A simplicidade da imagem contrasta com o séquito, as caravanas, os jatinhos e o exibicionismo policial em torno do depoentes atuais. Foto de Guina Araújo Ramos

por Guina Araújo Ramos (do blog Bonecos da História) 

Em vídeo que viralizou na Internet, o atual Ministro da Educação, Abraham Weintraub, surpreendeu todo o Brasil com uma declaração bombástica: ”Os comunistas estão no topo do país. Eles são o topo das organizações financeiras; eles são os donos dos jornais; eles são os donos das grandes empresas; eles são os donos dos monopólios".

Realmente, para alguém que tenha vivido (ou se informado sobre) as últimas décadas da História do Brasil, parece difícil perceber alguma verdade nesta afirmação. Logo me lembrei de histórica personagem do movimento comunista no Brasil, que batalhou por múltiplas causas políticas no correr de praticamente todo o século XX, e fiquei tentando (mas não fui capaz de) imaginar o que Luiz Carlos Prestes diria disso...

Tentando entender o momento atual, acabo de encarar a maratona de leitura da sombria trilogia “Os Subterrâneos da Liberdade”, romance memorialista de Jorge Amado, formada pelos livros “Os ásperos tempos”, “Agonia da noite” e “A luz no túnel” (e nem este título alivia o terror que foram aqueles tempos). O autor faz um balanço da ditadura do Estado Novo e descreve a situação desesperadora dos militantes comunistas, perseguidos e torturados pelas forças policiais, ao mesmo tempo que explorados como força de trabalho pelos grandes proprietários, em indústrias e latifúndios. Ao fundo das cenas, além de Getúlio Vargas, se equilibrando entre fascistas alemães (e seus apoiadores integralistas) e imperialistas americanos (e seus sócios da burguesia local), estava todo o tempo a figura de Prestes, o mais importante preso político da época.

Com o fim do Estado Novo, Prestes foi anistiado em 1945, eleito senador pelo Rio e deputado constituinte (assim como o próprio Jorge Amado), vivendo um momento de liberdade que durou apenas até a “redemocratização” do país cassar tanto o partido quanto seus parlamentares...
Mais uma vez perseguido pela ditadura de 1964, Prestes manteve-se na clandestinidade até 1971, conseguindo então sair do país, para se exilar na antiga URSS.

Rio, 1979. Prestes volta do exílio e desembarca no Galeão. O líder comunista fala à multidão,
que reunia delegações de vários estados. Foto de Guina Araújo Ramos.

Prestes acena e agradece a recepção. Foto de Guina Araújo Ramos. 

Apenas no retorno do exílio, em 1979, tive oportunidade, é lógico, de fotografá-lo. E logo desde a chegada, ainda no aeroporto do Galeão (o hoje Tom Jobim), como parte de uma série de coberturas de retornos de exilados (incluindo Fernando Gabeira e Miguel Arraes) para as revistas da Bloch Editores, fotografando para a Manchete, sempre a cores, ou para Fatos & Fotos, em preto-e-branco.
A chegada de Prestes foi das mais concorridas, uma verdadeira multidão encheu o saguão do desembarque e se espalhou pela pista de acesso ao aeroporto, uma verdadeira aclamação.

A partir de 1980, agora pelo Jornal do Brasil, fazendo dupla com o repórter Carlos Peixoto, voltei a registrar os passos de Luiz Carlos Prestes. A princípio, acompanhando a maratona de intimações que sofreu uma delas em outubro, obrigado a comparecer à Polícia Federal, para prestar depoimentos em diversos processos, ainda dentro do quadro da ditadura de 1964. Ficou evidente que mantinha a postura altaneira, muito bem demonstrada na chegada do exílio, mas apresentou também, talvez por fidelidade às suas causas, grande simplicidade.Basta ver que, depois de horas de depoimento, e de ser acossado pelos jornalistas por longos minutos à saída, simplesmente deu alguns passos para um pouco mais distante da Polícia Federal do Rio de Janeiro, em direção à Praça Mauá, fez sinal para um táxi e lá foi ele embora em um fusquinha...

Na sequência da década de 1980, no correr dos eventos políticos em torno do governo João Figueiredo, que levaram ao fim da ditadura, Prestes volta à luta política, agora na legalidade. E resolveu apoiar, ainda que com ressalvas, a candidatura de Leonel Brizola ao cargo de governador do estado do Rio de Janeiro. Nesta campanha, fotografei Luiz Carlos Prestes em contato direto com os operários, a categoria central da classe social cujas causas, na condição de comunista declarado, sempre defendeu. Protegido por um boné em que se lia “Brizola na cabeça”, Prestes falou aos funcionários de estaleiros navais da Ponta d’Areia, bairro operário de Niterói. Apesar do apoio a Brizola na campanha de 1982, Prestes não se integrou ao seu governo, mantendo sempre postura crítica, com presença constante nas manifestações pela mudança do regime ditatorial. Foi já no governo Sarney, em 1986, que o fotografei pela última vez (em um frila para não sei mais que revista), em um evento na ABI, à frente de uma faixa que falava, muito justamente, algo como “o povo não vai pagar esta dívida”... 

Trazendo toda esta trajetória de vida política para este preocupante momento atual, quando novas formas de autoritarismo afloram e, como se percebe das falas de ministros e de outros políticos, há uma tentativa de fazer com que tanto conceitos como a própria História do Brasil sejam forçadamente reescritos, volto, um tanto espantado, à pergunta inicial: como Luiz Carlos Prestes, em outros tempos o Cavalheiro da Esperança, hoje em dia, se estivesse entre nós, ele que deixou como herança toda uma vida de luta contra as poderosas, bem como destruidoras, elites brasileiras, encararia estas inesperadas afirmações?

Afinal, as elites brasileiras (financeiras, midiáticas, empresariais, monopolísticas) são (ou serão) comunistas?

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terça-feira, 13 de novembro de 2018

Memória da propaganda: "não saia sem guarda-chuva"...



Em novembro de 1968, o Banco Nacional lançava nas revistas uma campanha que prometia "lucro certo" para investidores. Um guarda-chuva dominava a cena.

O guarda-chuva, aliás, tornou-se na década seguinte uma espécie de símbolo do banco mineiro, que dava de brinde aos clientes o utensílio com o logotipo da instituição.

A campanha ainda estava na mídia quando a ditadura lançou o AI-5, em 13 de dezembro de 1968. A partir do ato institucional que suspendeu garantias constitucionais, inclusive o habeas corpus, e abriu caminho para a institucionalização da tortura e dos assassinatos políticos, a barra pesou. Houve uma onda de prisões de jornalistas, escritores, artistas, funcionários públicos, estudantes, sindicalistas e políticos.

No Rio de Janeiro, entre militantes, foi adotada uma senha de alerta. Quando se sabia que determinada pessoa havia sido presa, significava que vários dos seus amigos ou contatos entravam em alto risco de sequestro por parte da frota de Veraneio, o sinistro utilitário usado pela repressão. A senha para tomar cuidado ou mudar de endereço era passada por telefone ou bilhetes - "Não saia sem guarda-chuva". Pelo menos um recorte da campanha acima foi colado em um corredor da Escola de Comunicação da UFRJ, na Praça da República.

O Banco Nacional, a propósito, pertencia a Magalhães Pinto, chamado de "líder civil" da ditadura e um dos signatários do AI-5.


Reprodução Jornal do Brasil

A relação entre alertas políticos e a meteorologia não era exclusividade dos militantes ou dos alvos em potencial da repressão. O Jornal do Brasil do dia 14 de dezembro de 1968, um sábado, noticiou a edição do Ato Institucional e, no alto da página, à esquerda e à direita, incluiu duas mensagens: a previsão anunciando dias sufocantes e a informação de que 13 de dezembro era o Dia dos Cegos. Foi a forma que Alberto Dines, então editor do JB, encontrou, há 50 anos, para denunciar a censura imposta à redação pelo AI-5.

Não custa deixar seu guarda-chuva por perto.

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Fotografia - Dos arquivos do fotojornalista Guina Araújo Ramos - Figueiredo, o último ditador?

Figueiredo dando pulinho. Gávea Pequena, Rio, 1983. Foto de Guina Araújo Ramos

Figueiredo ao sair do governo - Rio, 1985 - Foto Guina Araújo Ramos

por Guina Araújo Ramos (do blog Bonecos da História)

Em plena campanha presidencial de 2018, a discussão sobre os candidatos (não “entre”, que Jair Bolsonaro se recusa a participar de debates) tem mudado dos tradicionais “programas de governo” para conflitos mais radicais: Barbárie x Civilização e/ou Democracia x Ditadura.

Barbárie x Civilização, quanto ao Brasil, pode até parecer retórico, “apenas” um reflexo do terrorismo, das guerras, das ondas de refugiados, dramas que dilaceram a África, a Europa e o Oriente Médio.

Já o dilema Democracia x Ditadura, que tem raízes profundas no solo brasileiro, tornou-se tema recorrente. O motivo é mais do que sabido: o candidato Jair Bolsonaro, do PSL, os seus filhos também parlamentares, o candidato a vice-presidente, Gal. Mourão, e vários de seus correligionários, todos eles se referiram recentemente à intenção explícita de interferir no Judiciário, de desrespeitar direitos de minorias, de ameaçar os opositores de prisão ou exílio.

A defesa da tortura e a proposta de uma nova ditadura militar no Brasil, supostamente sem corrupção, aparecem em diversas falas do presidenciável. Jair Bolsonaro, sustenta seu adversário, Fernando Haddad, do PT, é uma ameaça à democracia, que também está sendo ameaçada por fake news.

Tudo isto me trouxe à mente um sisudo e autoritário Presidente da República que fotografei muito, um dito ditador, apontado até como mandante de torturas, e a pergunta: terá sido (ou será) João Figueiredo o último ditador do Brasil?...

Ao menos, sabe-se que João Figueiredo foi o último militar presidente do Brasil de uma série de presidentes militares instalados no Palácio do Planalto com o evento auto-batizado de Revolução de 1964.

O mesmo que mais tarde foi renomeado (por historiadores) para Golpe Civil-militar de 1964 (com sua consequente Ditadura, exacerbada pelo AI-5, de Dezembro de 1968) e, há pouco, “reinventado” pelo ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal, através do singelo epíteto de Movimento de 1964.

Desde o início de seu mandato (Março de 1979), acompanhei algumas visitas de Figueiredo ao Rio, especialmente para a Fatos & Fotos, da Bloch Editores.

A partir de Junho de 1980, ao passar para o Jornal do Brasil, Figueiredo virou figurinha repetida nas minhas pautas... Como exemplo, os vários registros do seu desembarque, e comitiva, no setor militar do aeroporto do Galeão.

Numa solenidade tradicional, todo ano realizada na Praia Vermelha, na Urca, no Rio, registrei Figueiredo entre vários dos seus mais ministros, mais o governador Chagas Freitas e o cardeal Eugênio Câmara, no palanque das comemorações militares da assim chamada Intentona Comunista de 1935. 

A foto é sugestiva pelo detalhe de que peguei um gesto seu que pode ser remetido a uma das suas mais sugestivas frases: “Prefiro cheiro de cavalo do que cheiro de povo.”.
Sinceridade, aliás, não lhe faltava. Tanto é que deixou muitas outras frases marcantes, em entre elas um autoelogio, bem ao estilo ditatorial: “Me envaideço de ser grosso!”...

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terça-feira, 4 de setembro de 2018

Armando Rozário, do outro lado do mundo

Bar Garota de Ipanema, 1983. "Em 1983, quando trabalhava para o Jornal do Brasil, passando, no carro de reportagem,
pelo famoso bar Garota de Ipanema, vejo Armando Rozário sentado solitariamente em uma mesa, ao fundo. De dentro do carro, com uma zoom 80-200mm, consegui fazer, por mero divertimento, esta foto do já então famoso colega jornalista".(Foto Guina Araújo Ramos)

por Guina Ramos ( do blog Bonecos da História)

Entre tantas outras grandes perdas que o Brasil vem sofrendo, uma atinge especialmente a Fotografia brasileira (aliás, a mundial): faleceu neste domingo, 02/09, aos 86 anos, o fotógrafo Armando Rozário.

Nascido em Hong Kong (mas, oriundo da vizinha Macau, colônia portuguesa ao sul da China), Armando Rozário veio para o Brasil na década de 1950 e se tornou figura histórica do nosso fotojornalismo. Sua trajetória profissional mostra a intensa luta por direitos e por justiça. Muito especialmente para nós, fotógrafos, seu pioneirismo na defesa de direitos autorais foi um marco para o reconhecimento de crédito de autoria nas fotos publicadas e pela garantia de direitos trabalhistas em geral.

Muito além da profissional, a sua trajetória de vida foi realmente uma grande aventura. Só ficou um pouco mais calmo nos últimos anos, já aposentado, mas ainda virtualmente ativo, a partir de sua casa na praia junto à foz do rio São João, entre Cabo Frio e Macaé.

O jornalista Luiz Peazê, no blog do lançamento de seu livro “Cronico – uma aventura diária – Nas Esquinas do Rio”, fez um sucinto, mas preciso resumo de sua vida: “Armando, para quem não sabe, é fotojornalista e nasceu em Hong Kong (1931). Trouxe da China para o Brasil, em meados da década de 1950, o método de desenvolvimento de fotojornalismo; antes disso, havia sido correspondente em Hong Kong e Macau, para a European Picture Service; Armando havia fotografado o início da revolução de Mao Tse Tung; fotografou Louis Armstrong quando este monstro do jazz decolava na carreira; fotografou a mãe do Presidente Juscelino Kubitscheck e com esta foto ganhou na justiça direitos autorais contra a Revista Manchete, criando jurisprudência na matéria; foi fundador da Banda de Ipanema; Armando tem um curriculum que não caberia aqui e, de tantas histórias interessantes a que gosto mais é a de que, em 1978, Carlos Drummond de Andrade e Otto Lara Rezende comentaram a galhardia de um jovem ecologista, fotojornalista, em crônicas no Jornal do Brasil, e o jovem era Armando Rozário.”

Pessoalmente, convivi pouco com Armando Rozário, de uma geração bem anterior à minha, mas fui colega, no Jornal do Brasil dos anos 1980, de seu filho Frederico Rozário, hoje um internacional fotógrafo especializado em surfe. E, afinal, tenho uma única foto de Armando Rozário, um tanto inusitada, talvez.

Em 1983, quando trabalhava para o Jornal do Brasil, passando, no carro de reportagem, pelo famoso bar Garota de Ipanema, vejo Armando Rozário sentado solitariamente em uma mesa, ao fundo.
De dentro do carro, com uma zoom 80-200mm, consegui fazer, por mero divertimento, esta foto do já então famoso colega fotojornalista.

Colega porque, assim como eu (mas, muito antes), Armando Rozário trabalhou na revista Manchete, de Bloch Editores, e contra ela abriu esse emblemático caso judicial (em torno do crédito da foto de D. Júlia Kubitschek, mãe de Juscelino, de 1968), base para outras reivindicações, do mesmo tipo, de fotojornalistas e para a prática, por parte das empresas, da citação de créditos autorais nas fotos.
.
No início deste ano, me inspirei na história de Armando Rozário para escrever o conto "O rosário de Macau" (inédito, a ser incluído em livro), criado especialmente para participar de concurso literário na sua terra de origem familiar, Macau, ex-colônia portuguesa e, hoje e até 2049, uma Região Administrativa Especial da China.

terça-feira, 22 de maio de 2018

Alberto Dines: o jornalista que fez diferença

Alberto Dines/ Foto: Reprodução EBC/TV Brasil

O Observatório da Imprensa está preparando uma edição especial sobre Alberto Dines.

Sua vida e legado jornalístico não caberiam nas poucas linhas da nota em que o instituto anunciou a morte do jornalista nesta manhã, aos 86 anos, no hospital Albert Einstein, em São Paulo.

Dines deixa marcas profundas no jornalismo brasileiro. Seu nome está ligado à evolução e ao aperfeiçoamento da mídia, à ética, à liberdade de imprensa e às referências de várias gerações de profissionais da imprensa. Nas últimas décadas, foi o teórico, sem nunca se afastar da prática, que questionou os rumos do jornalismo.

A prometida edição especial do Observatório da Imprensa certamente contará aos jovens jornalistas que enfrentam atualmente os desafios dos novos modelos e plataformas a trajetória de Dines e suas valiosas lições.




Aqui, registramos dois momentos que ficaram na memória dos tempos difíceis, quando a censura nada virtual era a "ferramenta" que atormentava editores e repórteres. Tentar um drible nos coronéis que ficavam de sentinela nas redações era uma obrigação. Esse jogo gerou pelo menos duas inesquecíveis primeiras páginas do Jornal do Brasil editadas por Alberto Dines.  Uma, quando a  ditadura lançou o AI-5, em 1968, e o recado possível foi dado no quadradinho da previsão do tempo no alto da página. Outra, ao noticiar a queda e morte de Salvador Allende, em 1973. O JB recebera ordem expressa para não publicar foto do sangrento golpe no Chile. E a opção por dar a capa sem foto, com texto em destaque, sem título, obteve maior impacto dramático, exatamente o que os coronéis queriam evitar. Os censores saíram da história pela porta dos fundo, aquela primeira página ficou".

DINES NA MANCHETE E NA FATOS & FOTOS

Alberto Dines chegou à Manchete em 1957 como subeditor e secretário de redação. Não demorou muito foi para o Última Hora, mas já em fins de 1960 voltou à Bloch para dirigir a nova revista semanal da editora de Adolpho Bloch, a Fatos & Fotos.

No livro Maysa, o escritor Lira Neto dedica algumas linhas a uma capa da Manchete editada por Dines.



Em maio de 1957, pela primeira vez Maysa era capa de revista. O então assistente de redação da Manchete, Alberto Dines, encantou-se com os olhos da cantora, captado pelas lentes do fotógrafo Gervásio Batista. Dines não teve dúvidas: rompeu com a tradição dos planos americanos das capas da publicação e estampou um close de Maysa. Resultado: levou um sabão do dono da editora, Adolfo Bloch, que achou um exagero dar tamanho destaque a uma cantora em início de carreira. Mas a capa revelou-se profética. Dali a menos de um ano, Maysa já seria uma das cantoras mais famosas - e mais controvertidas - do país".

terça-feira, 6 de março de 2018

Editor de Arte do novo JB deixa o jornal. Carlos Negreiros, que trabalhou na Amiga e Mulher de Hoje, aponta equipe insuficiente e "falta de expertise" como fatores de falhas


A volta do Jornal do Brasil impresso foi celebrada pelos cariocas. A cidade tem uma inegável ligação afetiva com o JB.

Isso não quer dizer que a tarefa de reerguer a marca seja fácil.

Duas semanas após o relançamento, a redação sofre um importante baixa. O editor de Arte Carlos Negreiros deixa o jornal.

As primeiras edições do JB mostraram falhas compreensíveis para um começo de trabalho, mas além do aceitável. Alguns subtítulos, legendas e créditos de foto não foram preenchidos e acabaram publicados com os códigos técnicos indicativos de formato. Faltou revisão mais caprichada também. Em texto na sua página do Facebook, Negreiros relata a crise interna e opina sobre os motivos das falhas. "Infelizmente, o resultado de todas as mazelas foi atribuído à Editoria de Arte. Diante desse quadro, minha situação como Editor de Arte do nosso querido JB ficou muito desconfortável culminando com a minha saída".

Carlos Negreiros trabalhou no JB nos anos 1980 e no começo da década de 1990. Entre outros veículos, foi diretor de Arte das revistas Amiga e Mulher de Hoje, da extinta Bloch.

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

O meu JB • Por Roberto Muggiati





Reproduções do Caderno sdjb, do Jornal do Brasil, 1959-1961. Acervo RM

por Roberto Muggiati 

No inverno de 1958, liberado do serviço militar (Engenharia do CPOR), comecei um ritual de férias de inverno no Rio, o mês de julho inteiro num hotel de primeira classe na Avenida Atlântica, de frente para o mar em Copacabana.

Pegava um acanhado DC3 – para mim um ônibus espacial – no Aeroporto Afonso Pena – ainda não era “internacional”, um mero galpão – e fazia uma parada técnica de dois ou três dias em São Paulo.

Interessado em literatura beat e zen-budismo, conheci o escritor Nelson Coelho, que dirigia a sucursal do Jornal do Brasil em São Paulo. Ficava num mezanino na Rua 24 de Maio onde rolava um bom papo e um garçom de Summer Jacket servia Scotch on the rocks – antes da minha temporada londrina eu ainda não aderira ao straight.

Por indicação do Nelson, comecei a colaborar no lendário sdjb – Suplemento Dominical do Jornal do Brasil, que saía aos sábados. No começo de dezembro de 1959, publiquei um texto de página inteira, Jack Kerouac e as crianças do bop, naquela paginação aberta e modernosa do Amílcar de Castro. Eu tinha o endereço do agente do Kerouac, Sterling Lord, e mandei uma cópia para ele. Para minha surpresa, recebi duas semanas depois um cartão do próprio Kerouac, comentando a matéria.

Reprodução. Acervo RM
Datilografado na mesma máquina de On The Road. Simpático, ele se despedia espanholado, “Salud, hombre”... Guardei o cartão entre as páginas de Mexico City Blues, um livro de poemas do Jack, e só muito tempo depois me dei conta de um detalhe incrível: Kerouak postou o cartão para um fã desconhecido em Curitiba justamente às seis e meia da tarde da véspera de Natal, em Northport, nos arredores de Nova York, onde tinha comprado uma casa para sua mãe. Edipiano, fizera um acordo: ficaria seis meses em casa trabalhando e pegaria a estrada nos outros seis meses.

Publiquei ainda um texto retumbante no sdjb com o título de Zen Spengler Beat, pegando carona no ensaio de 1918 de Oswald Spengler, A Decadência do Ocidente.

Em Paris, 1961. Acervo RM

Em outubro de 1960, ganhei uma bolsa do governo francês para estudar no Centre de Formation des Journalistes, em Paris. Na época, escritores beats como William Burroughs, Allen Ginsberg e Gregory Corso moravam num decrépito hotel na Rue Gît-le-Cœur conhecido como Beat Hotel. Burroughs se drogava no quarto com os gatos, não deixava o hotel. Peguei Ginsberg na saída, esquivou-se, “no interviews!”  Já Gregory Corso, compatriota italiano, foi mais acolhedor. Encaramos muitos expressos em cafés de calçada, lembro da tarde com ele e outros americanos na Place Saint Germain, indignados com o fiasco de Kennedy na Baía dos Porcos.

Lançamento do romance The American Express, de Gregory Corso.
Paris, 1961. Acervo RM

Numa noite incrível, 24 de abril de 1961, fui ao lançamento do romance de Corso American Express, pela Olympia Press, de Maurice Girodias, a mesma editora que lançou Lolita, de Nabokov. Há uma confusão de memória aí. Os generais de direita que ocupavam a Argélia ameaçavam invadir Paris. Girodias convidou para La Grande Séverine, seu luxuoso restaurante na rive gauche, não sei por que eu acho que o lançamento aconteceu num outro lugar à beira do Sena. Em seu livro de memórias, dois polpudos volumes, Une Journée Sur La Terre, Girodias descreve a noite com um Allen Ginsberg de djelaba cabeludo e barbudo soltando a franga e entoando mantras – uma lembrança totalmente fora de contexto. Esse Ginsberg só desabrocharia depois do Ano da Flor, 1967, não chegou sequer a comparecer ao lançamento de Corso – dias antes, quando o interceptei para uma entrevista, Ginsberg se vestia todo de preto com um colarinho branco, parecia um pastor evangélico. Argumento final: se o evento fosse na Séverine, por que o fidalgo Girodias nos embarcaria em dois táxis para uma boca livre no La Coupole, em Montparnasse?

Naquela noite, ao voltar para casa – eu morava na ilha, Île de la Cité, o acesso, o Pont Neuf estava bloqueado por ônibus velhos e havia gendarmes a postos: “Vos papiers. S’il vou plait?” Minha atordoada convivência com os beats em Paris rendeu a única matéria que mandei, publicada em junho no Jornal do Brasil, com o título de Poesia política da Beat Generation, creditada a mim como “correspondente do SDJB”, para não melindrar o corresponde oficial do JB, Luiz Edgar de Andrade.

Lá se vão alguns anos. Foi muito bom enquanto durou.


HERÓIS ANÔNIMOS

Foto reproduzida do livro "A Língua Envergonhada", de Lago Burnett (Editora Nova Fronteira)
O copy desk era a mesa de edição de textos dos jornais americanos, onde se faziam o lead, o sublead, a pirâmide invertida e outras técnicas para agarrar o leitor na primeira frase. Uma maneira mais dinâmica e econômica (quanto menos palavras, melhor) de comunicar o fato, jogando para a lixeira o “nariz de cera” e outros introitos herdados da escola afrancesada da belle époque

Até os anos 1960, havia no Rio de Janeiro, capital federal, dezenas de jornais, espalhados pela cidade: os do Chatô, na Praça Mauá; o Correio da Manhã, na Gomes Freire; o Diário de Notícias, na Rua Riachuelo; o Diário Carioca, no comecinho da Avenida Rio Branco, inovador com seus títulos-haicais de 5-7-5 sílabas, daí a criação de JK, porque Juscelino Kubitschek simplesmente estourava. 

Foi lá, em 1960, patrocinado pela Esso, que fui de Curitiba fazer um estágio ao lado de redatores como Hélio Pólvora e Raul Giudiccelli. Estes anônimos para o grande público se esforçavam para fazer seu nome, traduziam escreviam romances. Na Bloch traduzi da trilogia máxima do Henry Miller Sexus; Hélio Pólvora traduziu Nexus e Plexus. Tinhorão, batizado “o legendário”, porque fazia legendas como ninguém, começou sua cruzada para interpretar a MPB pela ótica marxista. Ainda está na área. 

Em 1968 – um cinquentenário a ser celebrado – ele caiu nos meus braços na editoria de Artes e Espetáculos da Veja, em São Paulo, para escrever sobre tudo, menos música. Foi botado para responder as cartas dos leitores... Um jovem repórter que cobria música para nós era Tárik de Souza, depois mestre na área. Cruzei com o velho Macedo Miranda e o saudoso senador Mário Martins na redação da Fatos&Fotos em Frei Caneca, em 1965. Cipião Martins Pereira foi meu redator quando dirigi F&F já no Russell, ao voltar da Veja em SP. 

Um episódio final, que resume toda a loucura daqueles anos. Quinta-feira, fechamento do miolo da Manchete com uma matéria paga de 30 páginas – deslavadamente apresentada como editorial, sem a rubrica “Informe Publicitário” – exaltando o estado de Santa Catarina. A reportagem abria com uma carta do governador catarinense. O redator encarregado do fechamento, ao voltar do almoço com um quiproquó etílico, brigou com o editor, Justino Martins, e mandou tudo às favas, com a carta do governador de SC no bolso do paletó. O Marechal – chefe dos contínuos e X9 do Adolpho –fez uma via crucis por todos os bares da Zona Sul do Rio atrás do redator e da carta. 

Não lembro bem do desenlace, mas acho que entre mortos e feridos salvaram-se todos...

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

A Tribuna da Imprensa saiu das bancas há dez anos. O que não saiu até hoje foi a indenização dos jornalistas que trabalhavam lá

A última edição da Tribuna da
Imprensa: 1° de dezembro de 2008.
Veículos impressos quando vão à falência geralmente deixam um vazio nas bancas e um buraco sem fim no bolso dos jornalistas. Jornal do Brasil, Bloch, Tribuna da Imprensa... A lista é longa. Ou não pagam porque alegam que não têm bens ou deixam massas falidas ricas, mas que se consomem em burocracia e em caras estruturas administrativas ao longo dos anos, restando pendente a complementação das indenizações trabalhistas. A falência da Bloch Editores, por exemplo, atinge a maioridade: fará 18 anos no próximo mês de agosto. Ainda existem ações em curso e, entre aquelas que foram encerradas, a Massa Falida da Bloch deve parcelas da correção monetária de lei.

Há poucos dias, em reunião no Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, cerca de 40 profissionais habilitados em processos movidos pelo SJPMRJ foram informados pela advogada Claudia Duranti que ganharam as ações para recebimento dos valores que o jornal lhes deve, mais de R$3 milhões, no total. Ganharam, mas não vão levar, pelo menos não em curto prazo. A Tribuna deve a outros credores mais de R$ 400 milhões. Segundo a advogada do SJPMRJ, "a saída para que os jornalistas recebam o que lhes é devido mais rapidamente requer uma ação para que sejam privilegiados os créditos trabalhistas, que são de natureza alimentícia, e têm prevalência sobre as demais dívidas". Ou seja, a longa luta deverá continuar.

A Tribuna fechou as portas em dezembro de 2008. Na última edição, o proprietário, Hélio Fernandes (aos 98 anos, ele se mantém ativo no blog oficial da Tribuna), escreveu no editorial da primeira página que era "momentânea" a interrupção da circulação. E lá se vão quase dez anos. Hélio Fernandes acreditava que logo receberia uma milionária indenização do governo federal por ter sofrido censura prévia e represálias durante oposição à ditadura militar. Embora o STF tenha reconhecido o direito à indenização, esse processo ainda se arrasta.

sexta-feira, 21 de julho de 2017

Memórias da redação: o dia em que Alberto Jacob foi cobrir para Fatos & Fotos a guerra que não aconteceu...


Trechos de um capítulo do livro "Memórias de um repórter", de Fernando Pinto. Junto com o
fotógrafo Alberto Jacob, ele cobriu a "Guerra da Lagosta" para Fatos & Fotos. 

O contratorpedeiro francês Tartu. O primeiro flagrante de um dos navios de guerra que invadiram os mares
do Nordeste durante a chamada "Guerra da Lagosta". A foto de Alberto Jacob, feita a bordo de um helicóptero militar,  foi publicada na Fatos & Fotos, cedida à Marinha do Brasil e reproduzida em jornais brasileiros e franceses. 
Entre 1961 e 1963, barcos franceses capturavam ilegalmente, no litoral do Nordeste, toneladas de lagostas. Pescadores, pequenas empresas e jangadeiros denunciaram a pirataria. As gestões diplomáticas com a França, então governada por De Gaulle, não avançaram e a Marinha brasileira enviou para a região a corveta Ipiranga, que apreendeu o pesqueiro francês Cassiopée.

A França enviou uma força-tarefa de peso, até com o porta-aviões Clemenceau, para as proximidades da área onde agiam os piratas franceses. O governo brasileiro mobilizou mais navios de guerra, a FAB e o 4° Exército sediado em Recife.



O relato reproduzido acima é um trecho do livro "Memórias de um repórter" de Fernando Pinto (Editora Thesaurus). Ele formou com o fotojornalista Alberto Jacob a dupla enviada al mare pela Fatos & Fotos para cobrir a "guerra" que acabou não acontecendo. No campo diplomático, posteriormente, o Brasil teve reconhecidas suas razões no episódio.

Com a foto "A Mão de Deus", Alberto Jacob
ganhou o Prêmio Esso  de 1971,
quando trabalhava no Jornal do Brasil. 
Alberto Jacob morreu na última terça-feira, no Rio, aos 84 anos.
O carioca começou sua carreira na Revista do Rádio, foi contratado pela Sétimo Céu, da Bloch, e integrou as equipes da Fatos & Fotos e Manchete que acompanharam a construção de Brasília, a citada "Guerra da Lagosta", a queda de João Goulart e as passeatas de protesto contra a ditadura.

Transferiu-se para o JB, onde ganhou um Prêmio Esso, em 1971, com a famosa foto da freira quase atropelada por um ônibus. "A mão de Deus" foi o nome com que ele batizou a imagem premiada.

Alberto Abraão Jacob foi um dos grandes mestres do fotojornalismo brasileiro.



quarta-feira, 15 de março de 2017

Deu na revista Piauí: O que há por trás da volta do Jornal do Brasil...



por Consuelo Dieguez (para a revista Piauí) 

O empresário Omar Resende Peres, conhecido pelo apodo de Catito, ganhou espaço na imprensa por recentes aquisições que ampliaram o espectro de seus negócios. Dono dos restaurantes La Fiorentina e Bar Lagoa, no Rio, ele também arrematou o combalido e folclórico Piantella, em Brasília, que reúne há décadas a nata da política nacional. Do ramo das panelas e fogões, Catito migrou para o do jornalismo. Ele está finalizando os termos do contrato de arrendamento da marca Jornal do Brasil, cujos direitos de uso pertencem, desde 2001, ao empresário baiano Nelson Tanure, dono da Companhia Docas do Rio de Janeiro, entre outros negócios. Em 2001, Tanure arrematou a marca da família Nascimento Brito, dona do jornal e da rádio JB, por um período de noventa anos. Catito disse acreditar que o negócio estará concluído dentro de três semanas. Seus planos para o Jornal do Brasil são ambiciosos. Na contramão da ordem mundial, ele quer ressuscitar a versão impressa do jornal, que deixou de circular em 2010. Desde então, o JB só existe na internet.

Durante uma conversa no Bar Lagoa, Catito me disse ter consciência de que os jornais em papel tendem a desaparecer e, por isso mesmo, ele não está criando uma nova marca. “O negócio só é viável porque se trata de uma marca tradicional, da qual os leitores cariocas ficaram órfãos em 2010. Jamais ousaria abrir um jornal impresso que não tivesse o peso do nome Jornal do Brasil”. Será lançado em papel com data para acabar. Ele estima que dentro de três anos o JB voltará a circular apenas na versão digital,. Então por que investir nesse negócio? “Acredito que não há forma de dar credibilidade a um meio online sem que tenha a sustentação de um jornal impresso.” Assim que a transação com Tanure for concretizada, o impresso, de acordo com suas estimativas, pode começar a circular em noventa dias, o que ocorreria entre julho e agosto.

A viabilidade da empreitada, segundo ele, será garantida pelo baixo custo da operação. O jornal terá apenas duas seções físicas: a de política e a de cidade, para as quais serão contratados cinquenta jornalistas que vão produzir conteúdo exclusivo para o JB.

LEIA A MATÉRIA COMPLETA NA REVISTA PIAUÍ, CLIQUE AQUI

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Deu no Portal Imprensa: a volta da edição impressa do jornal do Brasil. Publicação quer contratar 30 jornalistas

(do Portal Imprensa)

Com novo controlador, “Jornal do Brasil” volta às bancas do Rio de Janeiro
Segundo a Folha de S.Paulo, o empresário Omar Peres fechou neste mês negócio com Nelson Tanure, antigo controlador da empresa. O objetivo é vender diariamente cerca de 30 mil exemplares do "novo JB". Segundo Peres, o "JB" será vendido apenas nas bancas cariocas. Não haverá assinaturas. A primeira edição sairá em maio.
A princípio, a publicação terá dois cadernos, um com 16 páginas e outro com seis, e aos domingos ganhará uma edição ampliada com 24 páginas no primeiro caderno.

LEIA A MATÉRIA COMPLETA NO PORTAL IMPRENSA,. CLIQUE AQUI

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

O JB vai voltar? Empresário Omar Peres adquire a marca Jornal do Brasil. O objetivo seria relançar versão impressa .


Segundo o colunista Maurício Lima, da Veja, o empresário Omar Peres adquiriu de Nelson Tanure a marca Jornal do Brasil. O titulo do jornal carioca foi a leilão há alguns meses por determinação da Justiça do Trabalho: uma das sessões acabou sustada e outra não teria obtido lances mínimos.

A renda do leilão frustrado deveria ser destinada ao pagamento de indenizações trabalhistas devidas pelo antigo proprietário aos ex-funcionários do JB.

A nota da Veja não entra em detalhes da operação de venda agora anunciada e nem de como ficarão os interesses dos jornalistas que levaram calote de gestões anteriores.

Nos últimos anos, Peres adquiriu algumas marcas-símbolo do Rio, como os restaurantes Fiorentina e Bar Lagoa. Ele é também sócio de Ricardo Amaral no projeto de reabertura mítico Hippopotamus. E constrói o Rian na Av. Atlântica, no Leme. O nome remete ao de um cinema que era point nos anos 1950 e 1960 na mesma avenida.

Desde agosto de 2010, o JB se mantém em versão digital. Omar Peres, que ainda não confirmou a notícia, teria planos de relançar a edição impressa do Jornal do Brasil.


sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Do Jornal do Brasil "Revista famosinha não gosta de professor"

por Walmyr Júnior* (para o Jornal do Brasil) 

A revista Veja afirmou recentemente que o profissional de educação é um peso para o Estado. Fiquei estarrecido e enojado com essa matéria, por perceber os interesses do grupo que administra a revista. A tendenciosa matéria afirma que os custos com os professores oneram as contas públicas, pois o estado ‘gasta muito’ e se perde muito dinheiro.

Essa falácia reproduz a postura de sempre desse tipo de jornalismo. Esse grupo não reconhece que a educação e a escola pública são fundamentais para a formação do povo brasileiro. Eles querem uma formação acrítica, que não discute com alunos e promovem diálogos, nos moldes da ‘escola sem partido’, justamente para terem ainda sob suas asas um povo pobre e sem estudos.

Para esse grupo a educação pública e de qualidade não pode ser oferecida para todas e todos, ela deve continuar sendo um privilégio das elites econômicas do país. Por isso vemos com tanta nitidez esses grupos se colocando contrário ao financiamento da graduação e pós graduação  destacado em suas matérias.

Eles não vão calar a educação com uma mordaça. Sabemos que os professores sofrem com atrasos de salários, com a falta de material didático, com precárias instalações das escolas. Vemos cotidianamente salas superlotadas, sem refrigeração, com goteiras no tempo de chuvas e vemos os professores lidarem com conflitos diários quando dão aulas em territórios criminalizados.

Além disso, professores colocam cotidianamente recursos dos seus baixos salários para comprar material de trabalho. Encaram a sala de aula como uma área de transformação social e não como uma fonte de renda.

Para aqueles que querem condenar os verdadeiros heróis dessa nação, podem desistir. Estaremos unidos contra o seu conservadorismo.  O professor é meu amigo, mexeu com ele mexeu comigo.

* Walmyr Júnior é morador de Marcílio Dias, no conjunto de favelas da Maré, é professor, membro do MNU e do Coletivo Enegrecer. Atua como Conselheiro Nacional de Juventude (Conjuve). Integra a Pastoral Universitária da PUC-Rio. Representou a sociedade civil no encontro com o Papa Francisco no Theatro Municipal, durante a JMJ.

LEIA NO JORNAL DO BRASIL, CLIQUE AQUI

segunda-feira, 7 de março de 2016

Jornal do Brasil: a história do repórter que ganhou um elevador como indenização trabalhista. Mas não levou.





Previsto para amanhã, dia 8 de março, o leilão da marca Jornal do Brasil, por determinação da 57ª Vara do Trabalho, é mais um capítulo na história de um dos títulos mais importantes da imprensa brasileira.
E simboliza, infelizmente, um drama comum na vida dos jornalistas. Na derrocada, grandes empresas de comunicação ignoram seus compromissos trabalhistas e a conta vai para o bolso dos mais fracos, os trabalhadores. Processos se arrastam na Justiça. Há numerosos casos. Vidas costumam ser quitadas antes das indenizações. A Bloch, por exemplo, faliu em 2000 e ainda não foram concluídos os pagamentos devidos aos ex-funcionários. Os jornalistas do Jornal do Brasil ainda lutam pelos seus direitos. O valor inicial do título do JB é 3,5 milhões de reais. Caso não haja licitante, o leiloeiro público, Nacif, fará uma segunda tentativa no dia 22 de março.

Se o leilão se efetivar, o título irá parar nas mãos de uma ex-funcionária do JB. Será um bem mais valioso, certamente, do que o que coube ao repórter Marceu Vieira: um reluzente elevador. Que, aliás, segundo o texto publicado no blog do jornalista e reproduzido abaixo, foi a leilão mais de uma vez.  "Mas, evidentemente, nenhum maluco apareceu querendo arrematá-lo", escreve Marceu.




por Marceu Vieira (do blog do autor, texto publicado no dia 2 de março de 2016)

"Meu coração insiste em ser juvenil. Apesar da idade que já rouba do corpo a condição de jovem, ele, meu coração, insiste em ser juvenil.

Tantos sentimentos antigos moram no meu coração. Esta renitência com a poesia. O casamento longevo e fiel e indissolúvel com a música. As ruas da infância em Morro Agudo. Aquele gol mal anulado no campinho do seu Lalinho. As noites de cantoria no Bar-Te-Papo. O sorriso de Adalgisa com suas promessas jamais cumpridas. Tanta coisa.

Meu coração invadido por segredos sem importância. Meu coração que há tantos anos me derruba e me revigora.

Meu coração esquecido num banco de praça em Vila de Cava. Meu coração atingido por uma bolada atrás de uma das balizas do campo do Morro Agudo Futebol Clube. Meu coração que dava voltas no salão nos bailes de carnaval do Vasquinho. Meu coração no trem 33 da Central do Brasil.

Por fim, meu coração que subia e descia nos elevadores de aço inox reluzente da entrada principal do “Jornal do Brasil”. Ou nos elevadores de trás, um deles de carga, que ia e vinha tão lento quanto lento sempre foi o meu coração no percurso entre o apego e o desapego.

Pois meu coração abre agora novamente seu baú de lembranças, muitas delas inúteis diante do julgamento da maioria, pra contar que é meu – é sério, é meu – um dos elevadores do velho JB, naquele prédio ainda tão impregnado de histórias da Avenida Brasil 500, no Rio, onde hoje funciona o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into).

Não sei qual dos elevadores, mas que ele é meu, é meu. Pertence a este cronista digital. Alguém aí se interessa em comprar?

Peço perdão e licença a quem é mais jovem e talvez não consiga ver graça na memória de certas coisas. Perdão, licença.

A caixa postal do cronista já foi, inclusive, alvejada por críticas e sugestões assim, de gente que, em suas certezas sempre bem-vindas, recomenda mais reflexões sobre o presente ou especulações sobre o futuro, e “menos mimimi sobre o passado, Orfeu, quer dizer, Dirceu, ops, Lineu.”

Por “mimimi sobre o passado” entenda-se falar de coisas como o velho “Jornal do Brasil”, onde eu havia sido cronista pela última vez, num intervalo que já vai inteirar 18 anos – e onde ainda permanecem, hoje, vagando, as assombrações daquele jornal e… o meu elevador!

Às vezes, julgamos já ter dito tudo, e não dissemos. É o caso. Por isso, perdão. Por isso, licença. Quero contar que um dos elevadores do ex-JB, hoje Into, é meu.

Não é uma brincadeira. É sério. É meu mesmo. A diretoria do hospital nem deve suspeitar, mas eu poderia, talvez, se quisesse, instalar na porta de um daqueles elevadores um pedágio e cobrar, quem sabe, um real de cada maca.

Esta história começa quando saio daquele JB, em 1998, e não recebo tudo a que tenho direito. O velho “Jornal do Brasil” já cumpria o calvário que o levaria à morte, depois de anos de grave crise de indigência financeira e, por último, editorial.

O advogado que eu havia contratado, na época, nem chegou ao fim da ação pra incluir em seu currículo a conquista esquisita de se tornar sócio de um elevador, do qual ele seria dono de um percentual na forma de honorários. No meio do caminho, meu advogado, gente muito boa, rompeu com seu passado nos tribunais, desabafou comigo as suas decepções com certas esquinas do Judiciário, largou a profissão, mandou-se pra Shangri-La e subscreveu a ação pra um colega.

“Logo na minha vez o cara achou de pirar”, pensei. Mas tudo certo. O advogado que o sucedeu também era gente boa. A ação seguiu, foi julgada, ganhamos… mas não levamos. O JB deu o calote nas parcelas, a dívida voltou a ser a original, não a negociada, e, sob as ordens da juíza trabalhista, um oficial de Justiça foi levantar o que poderia ir a leilão no bololô da massa falida do finado jornal pra quitação do passivo.

Explico, antes que alguém pergunte. Sou credor não do título JB, arrendado ao empresário Nelson Tanure, mas da massa falida. Em linguagem de trabalhador caloteado, sou credor do que restou do falecido jornalão – coisas como o maquinário velho que imprimia aquele diário que tanto prazer nos deu, a mim e a várias outras gerações de jornalistas e leitores.

Apura daqui, olha dali, o moço oficial de Justiça listou o que havia de mais valor naquele edifício já fantasma. E o diamante do colar de rotativas velhas já imprestáveis e de paredes descascadas e de vasos sanitários carcomidos nos banheiros abandonados e do mobiliário em petição de miséria, enfim, de tudo listado, sobraram, com algum valor ainda, os reluzentes elevadores do “Jornal do Brasil”.

O meu elevador foi a leilão judicial algumas vezes, mas, evidentemente, nenhum maluco apareceu, querendo arrematá-lo.

Como eram bonitos aqueles elevadores, como eram mesmo. Aqueles elevadores já carregaram a pressa do Castelinho (saudade) pra entregar sua coluna, o sorriso cheio de ironias do Oldemário Touguinhó (saudade), a rabugice e o talento e a competência do Xico Vargas (saudade), a inteligência de tanta gente, o exemplo de tanta gente, ainda aqui entre nós ou já do lado de lá do balcão da enorme confraria da vida.

Como deviam sobrar empregos naquele Brasil em crise, até ainda há pouco governado pelo Sarney, com seus “marimbondos de fogo”. Cada elevador tinha um ascensorista uniformizado. “Sexto andar, por favor.”

No elevador de carga do JB cabia um Fusca, acho. Será aquele o meu? Ainda existe lá no Into? Ou será um daqueles da entrada principal, assépticos, que chegavam a dar na gente vontade de morar dentro deles? Talvez eu nunca saiba.

Ou serei dono de mais de um, a esta altura, com a dívida submetida a tantas correções e correções e correções e correções? Talvez eu nunca saiba também.

Mas me conforta, de alguma maneira, juro, saber que, além da família Nascimento Brito, talvez eu seja o único dono de alguma coisa física do amontoado de História que restou do velho JB original.

Depois da minha despedida, em 1998, jamais voltei àquele prédio, onde, só agora eu percebo, meu passado ainda teima em arrastar correntes. Predião tão bonito e moderno, com heliponto no teto. Espigão-orgulho de seus funcionários, onde conheci a mãe da minha filha caçula e fiz tantos amigos. Gigante vistoso de concreto, onde fui chefiado pelo Marcos Sá Corrêa, o mais brilhante diretor de redação que encontrei na vida, e onde aprendi a ser o avatar do Ancelmo Gois (nós por ele, ele por nós!). Edifício-monumento ao jornalismo brasileiro, onde ouvi pela primeira vez – e quem disse foi o mestre Vilas-Boas Corrêa – que eu era um cronista.

Alguém quer comprar meu elevador?"

Para ler no blog de Marceu Vieira, clique AQUI

sexta-feira, 19 de junho de 2015

Memórias das Redações: "Pé frio", com todo respeito

Nos tempos da Enciclopédia Bloch com Moacir Japiassu
e José-Itamar de Freitas...

...na redação da Pais&Filhos com a diretora Angela Teresa e...

...na ElaEla, com a Cicciolina, que veio ao Brasil para posar
para a revista. Fotos: Arquivo Pessoal


Com a equipe da EleEla. Estão na foto, entre outros, Rochinha, Nelio, Weber, Macedo, Fábio e Luiz Paulo e... 
...com os colegas de várias redações em frente ao prédio da Manchete, na Rua do Russell. Fotos Arquivo Pessoal
por Nelio Horta (de Saquarema)
Todas as pessoas que trabalham ou trabalharam em jornais ou revistas, sabem o significado da palavra “FECHAMENTO”. Não sei como é hoje, mas antigamente, nas edições diárias ou semanais, é aquela  hora em que as teorias do bom senso são todas desrespeitadas, hora em que a pressão é total, hora em que bate o desespero com os prazos, cada vez mais apertados, hora do “deixa que eu chuto”, enfim um Deus nos acuda, com editores, repórteres e fotógrafos, tentando a melhor maneira de chegar ao tão famigerado “FECHAMENTO” dos cronogramas estabelecidos.
Com a crise econômica rondando as redações de todos os jornais, o que se vê, atualmente, são os “PASSARALHOS”, como se dizia no meu tempo, demitindo centenas de profissionais da imprensa que procuram alternativas de salário  para suas funções, embora se saiba que o salário de jornalista, hoje, é baixo, o que vem desestimulando os jovens na procura da tão chamada  profissão romântica.
“FECHAMENTOS”
Nos anos 50, muito novo, ainda estudante, consegui  um “bico” na revisão do “Diário da Noite”, jornal verde, do Assis Chateaubriand, que tinha o “Dr. Eiras”, como chefe da Redação, o Paulo Vial Corrêa e o Brum nas chefias e o Marcelo Pimentel, que era Editor de Política, chegou a ser Ministro e, ainda hoje, está no Correio Brasiliense  apesar da idade. Neste jornal  conheci o Sérgio Cabral, pai, o Evandro Teixeira, o Fernando Bruce e o Sandro Moreyra, nos esportes,  e o José Carlos Avellar, que era retocador de fotografias. Também conheci o Carlos Rizzini, o Nelson Rodrigues, o Austregésilo de Athaíde e o famigerado Volmar, no DP. Na redação do “ O Jornal”, alguns andares acima, no prédio da Rua Sacadura Cabral, 103, funcionava  “O Jornal  Feminino”, suplemento semanal dirigido por Elza Marzullo, uma precursora  na interação com o público. no qual também trabalhei, agora como desenhista. Os dois jornais FECHARAM.
Mas o objetivo principal desta matéria, não é o de falar dos jornais por onde andei, mas o de comentar as publicações, que, feliz ou infelizmente, ou por vários motivos, FECHARAM suas existências e me colocaram reconhecidamente como autêntico “ pé frio”.
Depois do “Diário da Noite, que FECHOU duas vezes, uma como jornal tradicional e outra como tabloide, sob o comando do Alberto Dines, do FECHAMENTO do “O Jornal”, fui trabalhar  na TV Tupi, na cenografia, com o Aldir, que mais tarde também foi da TV Manchete, que FECHOU. Na Tupi, meu chefe era o Carlos Thiré, casado com a Tônia Carrero e pai do Cecil  Thiré. Tudo era improvisado. Sem a tecnologia de hoje,mais parecia  uma carpintaria, com escadas,  madeiras e muitas “marteladas”. Eu trabalhava num anexo, em frente, e atravessava a rua arrastando câmeras recondicionadas, tendo o cuidado de fazer sinal para os ônibus que passavam, para  não ser atropelado. FECHOU.
Depois fui convidado pelo Ezio Speranza, um italiano boa praça que eu conhecera  nos tempos do “Diário da Noite”, para trabalhar na Fatos&Fotos, da Bloch, na Frei Caneca. Era uma equipe fantástica: Dines, José-Itamar de Freitas, Ney Bianchi, Macedo Miranda, pai, P. A. Grizzoli, A. Cordeiro de Oliveira, Raul Giudicelli, José Augusto Ribeiro e muitos outros. Na Bloch, além da Fatos&Fotos, trabalhei na Enciclopédia Bloch, na Pais&Filhos, na Sétimo Céu e na EleEla. Todas FECHARAM.
Nesta época era comum nós trabalharmos em vários jornais, de dia e à noite. Passei pelo “Diário de Notícias”, na Rua Riachuelo, onde trabalhei com o Luiz Luna, o Vanderlino Nunes, o Ascendino Leite, o Luiz Alberto e o Teixeira Heizer, nos esportes, o Adail, chargista, Maria de Lourdes Pinhel, Tobias Pinheiro, Nilo Dante, o fotógrafo Campanella Neto e o Dr. Prudente de Morais, neto, entre tantos outros. FECHOU.
No “Mundo Ilustrado” com o Hugo Dupin, pai do Fábio Dupin, no Departamento de Arte. FECHOU.
Com o Renée Deslandes fui trabalhar  na “Folha da Guanabara”, cuja redação era perto da praça Mauá. FECHOU.
Na época da Ditadura eu estava na “Tribuna da Imprensa”, do Hélio Fernandes. Trabalhei com o Guimarães Padilha, o Neil Hamilton e o Dom Rossé Cavaca, que tinha um fusca todo revestido em “madeira”. Um incêndio nas rotativas, provocado, segundo disseram  por militares, transformou toda a equipe em “soldados do fogo”. FECHOU.
Em 1º de maio de 1965, fui, chamado pelo Dines  para o “Jornal do Brasil”, o grande jornal que revolucionou a imprensa em todos os tempos. Eu me orgulho de ter sido de um jornal da qualidade e envergadura do JB, assim como de Bloch Editores. Comecei na redação como repórter, só mais tarde passei para o Dep. de Arte. Neste mesmo ano, o JB, que exportava profissionais, me  mandou para a “Gazeta do Povo”, de Curitiba, para fazer uma reforma no jornal. Durante o tempo que permaneci  lá,  a “Gazeta” saiu com a “cara do JB”. A edição impressa do JB  FECHOU, permanecendo a digital.
Trabalhei ainda na revista “Chuvisco” que  para variar FECHOU.
 Na “GIB modas” com o Gil Brandão que  também FECHOU.
Tenho cinco carteiras profissionais com as anotações/registros dos lugares onde trabalhei. Pagamentos ao INSS fiz durante todos estes anos (1952/2011). Pena que o salário de aposentado seja  apenas um, mesmo  fazendo duas contribuições simultâneas. Aposentei-me com dez salários mínimos, hoje recebo pouco mais de dois.
Contudo, tenho muitas  saudades de tudo e de todos.  Foram épocas  adoráveis, infelizmente pouco tempo para a família e uma vida feita  quase que exclusivamente  para o trabalho.
Como dizia o Luiz Reis, “AGORA É RECORDAR”, antes que eu também FECHE. A “FILA” ESTÁ ANDANDO...