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domingo, 15 de outubro de 2017

Mídia e Lava Jato na era do "jornalismo premiado"



por Márcio Chaer, Marcos de Vasconcellos e Fernando Martines (para o CONJUR)

Tradição dos lares brasileiros, a telenovela ganhou nova forma e horários. Agora, o cenário é bem mais simples: uma bancada com um ou dois apresentadores. E a exibição é de manhã, depois do almoço, às 20h30 e de madrugada. No enredo imutável, âncoras e repórteres mostram como a República está sempre por um fio. Os picos de audiência apontam que a fórmula agrada ao público.

Ganhador do prêmio Esso quando jornalista, o atual consultor de crises Mário Rosa constata que o público não quer mais saber quem matou Odete Roitman. Ele quer ouvir os áudios das conversas privadas do presidente. Ou ver vídeos de parlamentares pegando malas de dinheiro. O ponto alto da adrenalina agora é durante o noticiário.

Na análise de Rosa, essa dinâmica da produção jornalística tem motivações financeiras. Em um momento de crise econômica e disputa por atenção de um público ávido por smartphones a imprensa se vê tendo acesso a um material com alto potencial de audiência.

O jornalismo da 'lava jato' é um jornalismo cartorial, que vem com número de protocolo, que reproduz o discurso do Estado.

A fonte é o Estado, mesmo que as denúncias também sejam contra ele – o Estado são vários. Ministério Público Federal e Polícia Federal gastam milhões de sua verba para produzir áudios, vídeos e fotos comprometedores. Esse material é repassado a algum dos jornalistas que formam o círculo de proximidade. Mas alguém já disse que não existe almoço grátis. E nesse caso, o preço é a lealdade.

O Ibope está garantido. Mas é preciso que a denúncia seja publicada da forma que foi entregue, caso contrário, será exilado do grupo que furos jornalísticos prontos para o consumo a custo zero. Também está no contrato que além do filé, o músculo também deve ser ingerido. Para continuar recebendo notícias de impacto, o jornalista deve também publicar teses e devaneios de vez em quando. Para fortalecer as acusações.

Colocar os jornalistas para realmente investigar os fatos levantados nos processos, fazer o jornalismo que se aprende nos filmes e nas aulas, lembra Rosa, custa caro.

Se a cobertura da “lava jato” custasse R$ 5 milhões por dia, ela não seria feita.

A visão de Mário Rosa vem dos três lados do balcão. Já foi repórter, é consultor de crises e foi alvo de investigações. Com sua experiência junto às engrenagens da imprensa, Mario Rosa ajuda empresários e políticos a navegarem no tumultuoso mar do escracho público. De Léo Pinheiro a Ricardo Teixeira, de Fernando Henrique Cardoso a Lula, passando por Paulo Coelho. Recorre ao consultor quem vê sua imagem ser atacada publicamente.

Em junho de 2016, a visão de Mario Rosa sobre seu próprio trabalho mudou. Ele acordou com a Polícia Federal batendo na sua porta. Busca e apreensão. Era investigado por ter um contrato com a empresa de Carolina Oliveira, mulher do governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel. O chefe do Executivo mineiro é investigado na operação apelidada de acrônimo.

Não parou aí. A PF fez busca e apreensão em mais de dez empresas com as quais Rosa tinha contrato. Seu nome apareceu no noticiário. O casamento acabou e muitos negócios foram perdidos.

A tentativa de cura veio pela escrita. Rosa lançou recentemente o livro Entre a Glória e a Vergonha, no qual conta seus 25 anos como consultor das pessoas mais poderosas do país, no momento em que estão mais fragilizadas.

Em visita à redação da ConJur, logo antes do suicídio do reitor da UFSC, Luiz Carlos Cancellier de Olivo, o jornalista comentou os efeitos deletérios da escalada do punitivismo no noticiário nacional.

ConJur – Neste momento, o senhor acredita que seja possível algum veículo grande atuar criticamente com distanciamento em relação ao fenômeno dos escândalos políticos nos noticiários?

Mario Rosa – A questão é que se trata de um monopólio. Tivemos a crise do petróleo duas vezes, nos anos 1970 e nos anos 1980, e quem é que podia atuar criticamente contra a OPEP [Organização dos Países Exportadores de Petróleo]? Se você era dependente do petróleo, você tinha que aceitar o preço da OPEP. Hoje em dia, falando de informação, a OPEP é o Estado brasileiro. É a instância que detém o monopólio das informações e controla o fluxo de como elas são liberadas e a questão da exclusividade. Alguns veículos com menor relevância no cenário global das comunicações podem se dar ao luxo de remar contra a maré, mas a grande mídia não consegue ficar de fora. Ela tem que entrar nesse jogo e isso significa se submeter à essa regra de disputar a exclusividade de informações de furos, de nomes, da nova acusação, do novo vídeo, do novo áudio, do novo papel — essa gincana é interminável. O monopólio impõe as regras, essa é a característica dos monopólios. E hoje nós temos um monopólio de informações por parte do Estado brasileiro, e uma imprensa dependente. Qual o resultado disso? Uma imprensa que não pode fazer outra coisa a não ser aceitar as regras.

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