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quarta-feira, 29 de julho de 2020

20 anos da falência da Bloch Editores - Um drama sem fim...

O relato publicado em post anterior, de Jussara Razzé, foi escrito em 2008, oito anos após a falência da Bloch. Em um trecho, a autora foi premonitória ao escrever "já saber que teria que lutar anos na justiça para receber indenizações, salários atrasados, FGTS etc".

Massas falidas são entidades que costumam ter a lentidão de um paquiderme a caminhar em um lamaçal. Gastam anos para cumprir seus objetivos, estão sujeitas a acidentes jurídicos de percurso que atrasam processos e, enquanto isso, montam um estrutura que, para se manter, vai consumindo o patrimônio da empresa falida.

Comitiva de ex-funcionários da Bloch, liderada por José Carlos, é recebida pela Juíza Maria da Penha Nobre Mauro, que aparece na foto ao lado dos saudosos Murilo Melo Filho, José Alan Leo Caruso e Arminda de Oliveira Faria, além de Zilda Ferreira, Genilda Tuppini, do então presidente do Sindicato dos Gráficos do Rio de Janeiro, Jurandir Calixto Gomes, e de Roberto Muggiati e Jileno Dias. 

Ao longo de 20 anos, os ex-funcionários da Bloch muitas vezes se reuniram em assembleia no Sindicato dos Jornalistas do Município do Rio de Janeiro, em busca dos seis direitos. Para eles, a luta continua.

Durante quatro anos a partir da falência, muitos ex-funcionários bateram portas em busca de informações sobre seus direitos. Foi um tempo de desorientação, de empurra-empurra, de desrespeito. Um desses ex-funcionários era José Carlos de Jesus, ex-chefe de reportagem da Manchete e ex-coordenador dos Cursos Bloch de Jornalismo e de Fotografia. Diante das dificuldades e da falta de informação e preocupado por saber que bens da empresa falida já eram vendidos em leilões, ele mobilizou um grupo de colegas, conseguiu uma audiência com a Juíza Maria da Penha Nobre Mauro, da 5ª Vara Empresarial, à frente da Massa Falida da Bloch Editores, para começar a entender, como credor trabalhista, o funcionamento daquele "monstro" burocrático do qual todos dependiam para receber o que a Bloch devia aos seus ex-empregados.

Havia patrimônio suficiente  para cobrir a dívida trabalhista. Mas o histórico de muitas falências, especialmente de empresas jornalísticas, é o calote puro e simples, na cara de pau. Pense em algum extinto veículo do Rio, por exemplo, e encontrará um pilha de processos inconclusos e montanhas de dívidas trabalhistas.

Daqueles primeiros encontros com autoridades da Massa Falida da Bloch, surgiu a Comissão dos Ex-Empregados da Bloch Editores. Incansável, José Carlos abriu canais de comunicação e de informação,  passou a convocar assembleias dos ex-funcionários e a acompanhar o andamento do paquiderme. A primeira vitória foi o pagamento das indenizações aos ex-funcionários então habilitados, aí por volta de 2005. Estes receberam o chamado "valor principal".  Ficou faltando a correção monetária devida. A segunda vitória foi o recebimento de uma parcela dessa correção. Nos anos seguintes, vieram mais duas parcelas. Na época, alguns advogados de renome e com vasta experiência no ramo, foram unânimes em reconhecer que sem a persistência de José Carlos e as reivindicações que encaminhava aos vários síndicos da Massa Falida, ao promotor do Ministério Publico e à juíza, tais pagamentos seriam postergados, como normalmente acontece. Aquelas vitórias foram importantes, mas infelizmente não se repetiram. Os credores trabalhistas passaram a acumular derrotas. Viram a justiça determinar que um item valioso do patrimônio da extinta Bloch - as obras de arte do Museu Manchete, que abrigava na sede da Rua do Russell a Coleção Manchete de Arte Moderna Brasileira - deveria se partilhado com os herdeiros de Adolpho Bloch, e mais, que esses herdeiros teriam o privilégio de escolher no acervo as obras mais valiosas. Os vários testemunhos que demostraram ao longo do processo que as obras de arte eram da empresa e não de pessoas físicas foram desprezados pela justiça. Outra derrota catastrófica foi a justiça desqualificar a TV Ômega como sucessora da TV Manchete. Com isso dívidas trabalhistas de ex-funcionários da Bloch que provaram trabalhar também para a TV Manchete e que haviam sido pagas inicialmente pela Õmega, compradora da TV dos Bloch, foram debitadas à Massa Falida da Bloch. E essa conta vai a milhões.

O fato é que, 20 anos depois, os ex-funcionários da Bloch ainda têm a receber. Ultimamente, José Carlos Jesus encaminhou pedidos à Massa Falida para a realização de pagamento de pelo menos mais uma parcela da correção monetária devida. Aparentemente, não foi ouvido. Isso apesar de ter até mesmo argumentado que a Covid-19 agravou a situação de muitos ex-funcionários da Bloch, o que é verdade comprovável. Uma angústia que é crescente à medida que o tempo passa e se sabe que o  patrimônio que deveria garantir tais pagamentos sofre o risco permanente de ser consumido pela burocracia e por decisões judiciais como as exemplificadas acima.

ATUALIZAÇÃO em 01~8-2020 . Em mensagem enviada ao blog, José Carlos Jesus, presidente da Comissão dos Ex-Empregados da Bloch Editores e há quase 20 anos mobilizando os demais credores trabalhistas da extinta empresa, pede que seja registrado o justo reconhecimento pelas atuações da Juíza Maria da Penha Nobre Mauro e do ex-Promotor e hoje Desembargador Luiz Roldão de Freitas. À primeira, que permanece à frente da Massa Falida da Bloch Editores, e o segundo, que teve atuação no processo como representante do Ministério Público, Pela integridade, pela visão humana da lei, pelo respeito com que tratam e trataram os ex-empregados da Bloch, ele reitera que só tem a agradecer.

sábado, 8 de fevereiro de 2020

Deu no Globo: Massa Falida da Bloch Editores não paga o que ainda deve aos ex-funcionários da antiga editora

Reprodução/O Globo/ 08/2/2020

Hoje, na coluna do Ancelmo Gois, uma nota registra um drama de muitos ex-funcionários da Bloch ainda diante da falência da empresa ocorrida em agosto de 2000, há quase 20 anos.
A maioria dos credores trabalhistas recebeu o chamado "valor principal" das indenizações. Contudo a Massa Falida lhes deve parcelas da correção monetária, cujos pagamentos foram inexplicavelmente suspensos há mais de quatro anos. Muitos ex-funcionários fizeram acordos na Justiça há cerca de 15 anos e aceitaram uma redução das indenizações confiando que assim a quitação total se efetuaria em prazo razoável. Não foi o que aconteceu.

A Comissão dos Ex-Empregados da Bloch Editores se mobiliza  para que o compromisso seja respeitado e tem feito seguidos apelos à Massa Falida da Bloch Editores. Recentemente, foi criada uma camiseta sugestiva e bem-humorada que traduz a situação dos credores trabalhistas da extinta editora.   

sábado, 29 de julho de 2017

Bloch Editores: há 17 anos, a falência, o drama, a humilhação e a luta dos ex-funcionários


por José Esmeraldo Gonçalves

Acho que ninguém mais confere data em  "folhinha". Mas veja no calendário do seu celular: o próximo dia 1.º de agosto 'cai' numa terça-feira.

Foi também em uma terça-feira, há 17 anos, o 1.° de agosto mais dramático nas vidas dos ex-funcionários da Bloch Editores.

Ao longo da década de 1990, a Rede Manchete, do mesmo grupo, enfrentou grave crise. Foi vendida, devolvida, vendida de novo, voltou à Bloch e, afinal, foi comprada definitivamente por empresários paulistas, em 1999.

Se o fechamento da editora de revistas fundada em 1952 parecia àquela altura inevitável, tantas as dívidas, talvez a venda da TV injetasse alguma esperança, pensaria um otimista.

Mas, como disse Millor Fernandes, "o otimista não sabe o que o espera". Nem o pessimista, acrescento.

Há muito eram tensos os dias no prédio da Manchete na Rua do Russell. E, naquela manhã de terça-feira de agosto de 2000, a atmosfera estava mais pesada do que nunca. Talvez nem o mais pessimista entre aqueles que estavam no meio do furacão da Bloch esperasse o que estava por vir. Não naquela intensidade e nível de vexame.

Em questão de minutos, um "comando" bem treinado de oficiais de justiça percorreu os andares e ordenou que os funcionários que ainda estavam nos seus postos de trabalho abandonassem o local, levando seus pertences, e fossem literalmente para a rua após passar por uma humilhante e minuciosa revista. Não foram poucas as lágrimas que desceram de elevador.

Em depoimento no livro "Aconteceu na Manchete, as histórias que ninguém contou" (Desiderata), o coordenador de reportagem José Carlos Jesus recordou aquela terça-feira sombria:
“Quando o telefone da minha mesa tocou, me veio um estranho pressentimento. Tive a certeza de que aquela ligação estava me trazendo alguma coisa de muito grave. Do outro lado da linha, a voz, um tanto autoritária, logo confirmou. A ordem era que juntássemos todos os nossos pertences e nos retirássemos da sala e deixássemos o prédio o mais rápido possível. Só nos restava obedecer. Foi o que fizemos. A Bloch acabava ali. Para aqueles profissionais, uns, como eu, com trinta anos de trabalho, outros com quarenta, era o ponto final de um longo tempo de dedicação a uma empresa que já fazia parte da nossa vida, do nosso corpo e da nossa alma. Levei algum tempo para administrar o choque. ‘E agora?'”.

Bloch Editores: abandonada
às pressas em um triste 1° de agosto de 2000.
Há 17 anos... Foto bqvMANCHETE
Quem viveu aquela cena que não deixou selfies jamais a esquecerá. Anos depois, algumas fotos mostraram o que restou após o vendaval que varreu vidas profissionais e objetos que eram parte daquele que foi um dos maiores grupos de comunicação do país.

São imagens que dão uma ideia do que ficou para trás além das memórias.

Nos anos seguintes, os mais novos foram à luta e reconstruíram suas carreiras, outros não tão jovens, experientes, tentaram se adaptar a novos modelos e tecnologias ou descobriram alternativas fora do ofício e um número expressivo de antigos funcionários, os mais idosos, principalmente, passou a viver dias difíceis. Para muitos e saudosos colegas, difíceis e últimos.

José Carlos Jesus conta que o choque persistiu por meses. Processos de falência costumam ser longos e exasperantes para quem depende da quitação dos seus direitos. A legislação brasileira permite, infelizmente, que massas falidas se arrastem e acabem praticando autofagia. Quanto mais tempo levam mais consomem os bens que deveriam garantir suas dívidas. Era do conhecimento de todos que a Bloch Editores dispunha de um patrimônio importante e capaz de atender aos credores prioritários, que são os ex-funcionários. Mas nada atestava que tal patrimônio seria uma garantia irrefutável para o justo resgate dos direitos trabalhistas ou que a burocracia não o consumiria vorazmente.

Quem disse que pedra no caminho é apenas um verso de Drummond?

Ao mesmo tempo, sabia-se dos imprevistos e sombras que podem afetar e postergar um processo daquela magnitude. E a inércia e omissão dos principais interessados não ajudariam a torná-lo mais rápido e transparente. Coube a José Carlos propor iniciativas para acompanhar o desenrolar das ações da Massa Falida da Bloch Editores.

Por sugestão da Juíza da 5.ª Vara Empresarial da Comarca da Capital, Maria da Penha Nobre Mauro, foi formada uma comissão de ex-funcionários para tornar mais efetiva a comunicação entre os credores trabalhistas e aquela instância. Designado presidente da Comissão dos Ex-Empregados da Bloch Editores (CEEBE), José Carlos passou a se inteirar das etapas do complexo processo, promover assembleias regulares no Sindicato do Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, reunindo centenas de ex-funcionários, e a conduzir diplomaticamente as reivindicações do grupo - cerca de 2.500 pessoas -  junto ao Juízo, ao Síndico da MFBloch e ao Ministério Público.

José Carlos sempre registra como fator decisivo para as conquistas dos ex-funcionários ao longo de 17 anos o respeito, a abertura ao  diálogo, a sensibilidade sob o rigor da lei e o preciso senso de justiça da Dra. Juíza Maria da Penha Nobre Mauro.

Ao lado dos diretores da CEEBE, como Nilton Rechtman e Jileno Dias, e com a força participativa dos demais ex-funcionários da Bloch, o esforço resultou em vitórias: o recebimento do valor “principal” das indenizações, em 2009, três rateios da correção monetária, em 2012, 2013, 2014.

Contudo, o trabalho da CEEBE não terminou: há processos trabalhistas não concluídos, a MFBloch não encerrou a quitação da correção monetária devida aos processos findos, há bens da Bloch ainda a leiloar, houve derrotas na Justiça, com a MFBloch assumindo discutíveis responsabilidades de outras empresas, sem falar que determinados bens de legítima propriedade da editora destinados à quitação das dívidas, sendo a trabalhista prioritária, são frequentemente alvos de investidas por parte de terceiros.

Esse 1.° de agosto de 2017, 17 anos depois, sinaliza duas coisas aos ex-funcionários da Bloch:

- a burocracia dos processos de falência agride direitos trabalhistas, é desumana;

- quem quiser justiça que faça barulho e fique atento e forte. Apenas esperar não vai resolver seu problema.