domingo, 10 de dezembro de 2017

Luiz Carlos Maciel: o demolidor de dogmas...


Reprodução Instagram
por José Esmeraldo Gonçalves

Há dois anos, circulou nas redes sociais um post realista e nada surpreendente. O jornalista, escritor e dramaturgo Luiz Carlos Maciel, que morreu ontem aos 79 anos, avisava ao distinto público estava precisando trabalhar. No seu apelo, a constatação de que o envelhecimento, no Brasil, é quase criminalizado para quem não tem os privilégios nem os podres poderes da elite que se superaposenta..

"Um tanto constrangido, é verdade, mas sem outro jeito, aproveito esse meio de comunicação, típico da era contemporânea e de suas maravilhas, para levar ao conhecimento público o fato desagradável de que estou sem trabalho e, por conseguinte, sem dinheiro. É triste, mas é verdade. Estou desempregado há quase um ano. Preciso urgentemente de um trabalho que me dê uma grana capaz de aliviar este verdadeiro sufoco. Sei ler e escrever, sei dar aulas, já fiz direções de teatro e de cinema, já escrevi para o teatro, o cinema e a televisão. Publiquei vários livros, inclusive sobre técnicas de roteiro, faço supervisão nessas áreas de minha experiência, dou consultoria, tenho – permitam-me que o confesse – muitas competências. Na mídia impressa, já escrevi artigos, crônicas, reportagens… O que vier, eu traço. Até represento, só não danço nem canto. Será que não há um jeito honesto de ganhar a vida com o suor de meu rosto? Luiz Carlos Maciel.

Enquanto lia e pensava sobre aquele duro S.O.S, via em um canto datado da estante velhos jornais, livros e revistas nos quais Maciel estava presente direta ou indiretamente.

O título mais comum na mídia, hoje, ao noticiar sua morte, refere-se ao "guru da contracultura". Nos anos 1960 e 1970, principalmente, Maciel foi o autor e mensageiro que levou a esquerda a quebrar dogmas. Em livros, ensaios e perfis, mostrou que no idealismo e no comportamento de muitos jovens também havia uma herança caduca de preconceitos a dispensar. Maciel ofereceu alternativas para um tempo em que o túnel estava quase fechado e sem luz.

Por tudo isso, aquele franco apelo de Luiz Carlos Maciel não combinava com o seu legado e a importância do seu ativismo cultural. Ali na estante estava amarelada e rota uma pequena memorabilia da sua atividade jornalística, do Flor do Mal ao Pasquim e a edição brasileira do Rolling Stone, que dirigiu,  além de autores que ajudou a introduzir nas universidades, nos botecos de Ipanema e em seus assemelhados Brasil afora.  No Pasquim, sua coluna Underground era um farol, como se dizia então, um GPS da contracultura como é dito hoje. Mas Maciel também atuou na mainstream da mídia, como Última Hora, Correio da Manhã, Jornal do Brasil, colaborou com revistas da Bloch e trabalhou na Fatos & Fotos.

Soube da morte do Maciel ontem à noite por uma mensagem de Roberto Muggiati, que peço licença para transcrever:


"Viu aí?  Foi-se o nosso Maciel. Omitiram que ele trabalhou na Bloch nos anos 70 - não lembro bem onde, mas não foi na Manchete. Como depoimento pessoal posso dizer que em Curitiba, em 1959, com 22 anos, eu invejava Maciel, um ano mais jovem, que havia acabado de publicar um livro que corri para comprar, Samuel Beckett e a solidão humana, nos Cadernos do Rio Grande, editados pela Secretaria de Cultura gaúcha. Éramos, então, uma mistura de comunistas e existencialistas exaltados e apaixonados pela vida - em 1960, Maciel foi estudar teatro nos Estados Unidos, com uma bolsa da Fundação Rockefeller; e eu fui estudar jornalismo em Paris, com uma bolsa do governo francês. A ditadura militar atropelou nossos sonhos em 1964, mas na sua fase light (que iria até o final de 1968), ainda nos permitiu uma atuação ideológica: Maciel teve um papel preponderante nas montagem de O Rei da Vela (1967), de Oswald de Andrade, pelo Teatro Oficina de São Paulo. E eu lançaria um livro ostensivamente engajado, Mao e a China, cinco dias antes da decretação do AI-5, na sexta-feira 13 de dezembro de 1968.
Abolidos todos os direitos civis no país, a resistência política seria exercida de forma violenta nos Anos de Chumbo pela guerrilha urbana, com os consequentes assassinatos e torturas nos porões da ditadura. Aqueles desprovidos de temperamento suicida, optaram por um modo mais sutil de combate. Encontramos então na contracultura que embalava o mundo no final dos anos 60 uma maneira de fazer política pelas beiradas e brechas do Sistema. Meu segundo livro, em 1973, Rock: o grito e o mito, teve como subtítulo A música pop como forma de comunicação e contracultura. Luiz Carlos Maciel foi ainda mais fundo, assinando a coluna Underground no Pasquim e dirigindo a versão brasileira da revista Rolling Stone.
Nos anos 70 circulou também pelas redações da Bloch, onde formou um trio imbatível com Narceu de Almeida e Luiz Carlos Cabral. Um dia, os três – mais a atriz Maria Claudia, sua mulher, que o acompanharia até o fim - debandaram para as areias de Búzios e Cabo Frio: segundo Jaquito, foram “jogar pingue-pongue contra o vento...”. Era o Grande Desbunde, a outra face da moeda dos Anos de Chumbo. Maciel resistiu sempre, tornando-se o “Papa da Contracultura” no Brasil".

Por uma dessas armadilhas da vida, Luiz Carlos Maciel parte quando mais fará falta. Basta olhar em volta: o túnel fecha de novo e volta a se apagar em tempo de retrocessos, preconceitos e obscurantismo.


sábado, 9 de dezembro de 2017

Sylvio Silveira versus Severino Dias - A GUERRA DOS CHEFS ou DUELO NO OSCAR CORRAL



Por Roberto Muggiati

A festa se perde na distância do tempo e a memória turva mal consegue atravessar os vapores etílicos daquela noitada… Pudera: um grupo seleto de jornalistas e executivos da Bloch – homens e mulheres – esperava o jantar havia horas – três, quatro, não exagero – servido por garçons solícitos do que desejasse: champanhe, vinho, uísque, caipirinha e o que mais se pudesse esperar de uma adega bem sortida.
Era no apartamento de Oscar Bloch Sigelmann, no nono andar do edifício Machado de Assis, na Avenida Atlântica, onde Adolpho e Lucy Bloch tinham sua morada no segundo andar. Adolpho não estava presente, Oscar reinava supremo com esta oportunidade rara de mostrar que era um “jolly good fellow”... A atração da noite seria um pato, menos prosaicamente um canard à l’orange preparado pelo diretor da sucursal da Manchete em Paris Sylvio Silveira, que viajara especialmente para a ocasião.
Sylvio Silveira. 
A Bloch sempre atraiu personagens de todos os matizes que, embora representando uma engrenagem a mais na máquina, tinham sua história pessoal muito rica. O gaúcho Sylvio Silveira fugiu um dia da mulher com a roupa do corpo e foi parar em Paris no início dos anos 1950. Ninguém saberia explicar – muito menos ele, que nem músico era – como de repente se viu liderando a melhor orquestra de dança da França. Infelizmente, Sylvio não soube administrar o seu sucesso e perdeu o lugar para Eddie Barclay, que virou um magnata da música e dos discos na França e, milionário, passou a trocar de carro e de loura todo ano. Barclay e o gaúcho eram trogloditas em matéria de música, mas Sylvio dizia que ao band-leader bastava "benzer" o público com uma maraca, a rapaziada da orquestra fazia o resto. De volta à rua da amargura, Sylvio acabou sendo descoberto por Adolpho Bloch e virou seu factotum em Paris. Em pouco tempo, Monsieur Silveirá se tornava a eminence grise da sucursal da Manchete em Paris, plantada num prédio da Avenue Montaigne, uma das ruas mais chiques da cidade: na cobertura morava Marlene Dietrich, que costumava tomar banho de sol nua; outro morador ilustre era o cineasta Roman Polanski.
PARIS, janeiro de 1977 – Entre a anfitriã Sophie Bleustein-Blanchet e Roberto Muggiati, Sylvio Silveira é servido em almoço na cobertura do Studio Publicis, uma das maiores agências de publicidade da França, defronte ao Arco do Triunfo (No andar térreo, a pleno vapor, funcionava desde 1957 a Drugstore Publicis, primeira do gênero em Paris, fundada pelo presidente do Grupo, Marcel Bleustein-Blanchet.) Foi neste encontro com Bleustein-Blanchet que Adolpho Bloch decidiu criar no Rio uma versão brasileira da Fondation de la Vocacion – a Fundação da Vocação – entidade destinada a promover a educação através da concessão de Bolsas.

Sylvio não era jornalista, mas, como homem de confiança de Adolpho, cuidava de tudo. (Os Bloch, perversamente, diziam sempre: “Ninguém sabe fazer uma mala como ele”, aludindo, é claro às mil muambas que Sylvio era obrigado a colocar entre roupas e sapatos, bugigangas que incluíam de perfumes e bijuterias a queijos, patés e vinhos.) No auge da ditadura militar, os Bloch ofereceram um jantar ao todo-poderoso Ministro da Economia Delfim Neto, em visita a Paris, e Sylvio botou os jornalistas da sucursal (quase todos comunas e exilados) na cozinha a descascar batatas e cebolas para o regabofe do Delfim.
Depois de décadas de Paris, Sylvio tornou-se exímio nas artes da gastronomia. Mas esta sua performance no Rio acabaria em verdadeiro desastre.  Sylvio iria preparar no apartamento do Oscar na Avenida Atlântica um canard à l'orange que era sua especialidade. Inadvertidamente, por não ter escolha ou até por sacanagem, Oscar deixou a infraestrutura a cargo de Severino Ananias Dias, o maître de Adolpho, que via no Sylvio uma ameaça à sua hegemonia.
Severino, Adolpho e Marechal. 

Como bom nordestino, Severino tinha ambições políticas. Nas festas da Manchete, por pura gozação, Cony sempre pedia que ele discursasse “em nome da redação da Manchete.” Severino sentia-se lisonjeado e soltava o verbo. Foi assim que, num aniversário do chefe, ele criou até um neologismo, ao se referir a “esta figura inevolúvel de Adolfo Blóqui...” Severino se candidatou a deputado, mas não emplacou. Tempos depois, casou com uma jovem do clã Avellino, detentor do poder em Vassouras, RJ. Elegeu-se prefeito de Vassouras, importante município fluminense que completou 160 anos em setembro e tem como lema Mihi maxime debetur Brasiliae incrementum (A mim, mormente, é devido o progresso do Brasil). Terminado o mandato, nos anos 1990, enquanto procurava novos rumos políticos, ainda em Vassouras, Severino morreu metralhado ao volante de seu carro, com a mulher ao lado, que nada sofreu. Acabou dando seu nome à Escola Municipal Prefeito Severino Ananias Dias. Seu filho, Severino Ananias Dias Filho, 33 anos, é o atual prefeito de Vassouras, até 2020.
Dezenas de editores e altos funcionários da Bloch — tinham de acordar cedo no dia seguinte — mas ficaram horas tomando coquetéis aguardando que os patos fornecidos pelo Severino descongelassem. Na espera, começaram até a rolar piadas, típicas de jornalista. Havia na França um conhecido jornal satírico chamado Le Canard Enchaîné (O pato acorrentado); canard, na verdade, é gíria para “jornal”. O pato do Sylvio foi batizado de Le Canard Déchaîné, o pato desvairado.
Severino fez os palmípedes chegarem às mãos de Sylvio duros como blocos de gelo. Desesperado, Sylvio tentou até apressar o descongelamento dos bichinhos com o secador de cabelos da anfitriã, Inês. Finalmente, pouco antes das badaladas da meia-noite, os canards vieram à mesa, com uma bela e apetitosa aparência. Mas os patos não haviam resistido ao supercongelamento: sua carne ficou fibrosa e insossa. Com um sorriso nos lábios, o elegante Monsieur Silveirá tentou dar o máximo do seu talento culinário, mas o boicote ostensivo do Severino foi fatal e o pobre Sylvio acabou pagando o pato.
Cabe aqui outro bordão da Manchete: o francês fake “chose de loque” (coisa de louco), que nós transformamos em “chose de Bloch”. 

Viu isso? Lugar de William Waack foi ocupado...

Reprodução Instagram
por Ed Sá 
Como naquele mesa ainda está faltando ele, o ex-funcionário Diego Rocha, que vazou o vídeo com o flagra de ofensas racistas de William Waack, voltou à  Rede Globo e fez uma foto tranquilamente sentado na bancada do jornalista. Foi uma das imagens (ao lado) que mais repercutiram na semana que passou.

Ainda não se sabe quem volta ao trabalho antes se Guerrero, do Flamengo, que recebeu gancho da Fifa, ou Waack, afastado pela Globo. Um pegou um ano de suspensão. O outro sofreu impeachment sem prazo. Corredores da emissora especulam que ele volta em janeiro. Ao mesmo tempo, o SBT teria demonstrado interesse em colocar Waack no seu telejornal ao lado de Rachel Sheherazade.

Quanto à irônica foto de Diego Rocha em plena redação, é motivo de investigação interna na Globo que tenta descobrir como ele conseguiu entrar. Segundo o UO, ele teria ido antes do RH. Como se sabe e a internet curtiu, Diego publicou a foto nas redes sociais com a mensagem "O Que Acham?” e a hashtag #didiconoplimplim.

Guina Ramos lança livro com mais de 300 fotos



Mensagem de Aguinaldo Ramos, fotógrafo que trabalhou na Manchete

"Neste domingo, 10/12, a partir das 16h, participarei do FIM - Fim de Semana do Livro no Porto - Praça Mauá, no Espaço dos Escritores Independentes, ​com o lançamento (mais um!) do livro "Bonecos e Pretinhas" (ou, mais precisamente, Neste domingo, 10/12, a partir das 16h, participarei do FIM - Fim de Semana do Livro no Porto - Praça Mauá, no Espaço dos Escritores Independentes, ​com o lançamento (mais um!) do livro "Bonecos e Pretinhas" (ou, mais precisamente, "[O dos] Bonecos e [a das] Pretinhas".)

"Bonecos e Pretinhas" é uma novela ilustrada, com 81 páginas de texto e mais de 300 fotos, que conta a história do reencontro (e do possível encontro...) de um casal de (quase) históricos jornalistas, em meio a uma indecifrável oscilação entre Niterói e Rio de Janeiro e dentro do panorama geral do país.

Estando, porém, no FIM, e dada a gravidade do momento nacional, faz-se necessário relembrar o que já foi publicado: "2112 ...é o fim!", o livro que traça "uma espécie de painel do i(ni)maginável futuro do Brasil", através de crônicos contos que "descrevem" os próximos 100 anos, baseados estruturalmente em importantes obras literárias e exemplares acontecimentos históricos. Em suma, "o Brasil caindo nos contos de um futuro mal passado"...

Estes e todos os meus demais livros, todos publicados por Guina &dita, estarão, no atacado e no varejo, juntos com todos nós, no FIM!
Nos vemos lá!

Guina Araújo Ramos

Memórias da redação: Hollywood já foi aqui...

Conversa com o leitor assinada por Justino Martins. Clique na imagem para ampliar


sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Tancredo e as capas: aconteceu na Manchete



Por Roberto Muggiati

Esta história vai longe no tempo e tem muito parêntese, mas vale ser conhecida. 



Foto de Gervásio Baptista

Em 1954, com apenas dois anos de vida, a revista Manchete enfrentava seu batismo de fogo na guerra das bancas – e se saía muito bem, graças à qualidade gráfica e à importância que dava ao fotojornalismo. A capa da edição extra sobre a morte de Getúlio Vargas trazia uma foto em preto-e-branco de Gervásio Baptista e tinha como foco central o deputado Tancredo Neves tomado por uma crise convulsiva de choro, cobrindo o rosto com as mãos. Tancredo quase não conseguira se eleger em 1950 para seu primeiro mandato federal. Graças àquela foto, Tancredo singraria vitorioso nas urnas vida afora.. Por isso, seria eternamente grato a Gervásio. Quando foi eleito para Presidente da República em 1985, Tancredo imediatamente convidou Gervásio para ser o fotógrafo oficial da Presidência.

Nas horas que antecederam a cerimônia de posse do primeiro Presidente pós-ditadura militar, no período batizado de Nova República, os acontecimentos se precipitaram. Na segunda-feira, 13 de março, na Casa da Manchete em Brasília, Adolpho Bloch recebeu Tancredo e dona Risoleta para um grande jantar. Para a ocasião, o chef da Bloch, Severino Ananias Dias, deslocou-se até a Capital Federal com uma equipe de cozinheiros e garçons e a fabulosa coleção de panelas de cobre da cozinha do Russell. Na manhã seguinte, durante uma missa de Ação de Graças, fotógrafos e câmeras de TV flagraram o Presidente apalpando insistentemente o estômago. (Nenhuma relação de causa e efeito entre o banquete da Manchete e o mal-estar de Tancredo, embora inimigos da Bloch – e não eram poucos – tenham espalhado que a cuisine do Severino foi fatal para Tancredo.).

Às 22:15 de 14 de março, véspera da posse, o Presidente era internado às pressas no Hospital de Base do Distrito Federal para receber soro. Com o diagnóstico de apêndice supurado, os médicos disseram à família que Tancredo precisava ser operado com urgência. A família preferia que ele fosse removido para São Paulo, tinha até um jatinho à disposição. Mas os médicos de Brasília não cederam. O próprio Tancredo se meteu na discussão: “Deixem-me tomar posse e depois façam comigo o que quiserem.”

Na antessala do centro cirúrgico, uma plateia seleta de parlamentares-médicos e ministros de Estado nomeados aguardava. O pesquisador médico Luís Mir, autor do livro O Paciente - O Caso Tancredo Neves (2010) (*) , descreve: "A certa altura, houve a possibilidade de invasão da sala de cirurgia até por médicos do próprio Hospital de Base de Brasília. Era impossível impedir a entrada das pessoas. Entre médicos e não médicos, chegaram a circular, no Centro Cirúrgico e dentro da sala de cirurgia, cerca de 60 pessoas. Quando se iniciou a operação, havia dentro da sala 25 pessoas. Um show, ruinoso para os médicos e para o paciente". Ao abrirem o peritônio do (im)paciente, os cirurgiões não encontraram nenhum “apêndice supurado”, o órgão estava perfeito. Inventaram então um novo diagnóstico, de “diverticulite”, doença de que a maioria dos brasileiros nunca tinha ouvido falar. Soube-se depois que Tancredo tinha um leiomioma benigno, mas infectado. Os facultativos ocultaram a existência de um tumor, receando o impacto que a palavra “câncer” poderia provocar.

No dia seguinte, o vice José Sarney assumiu a Presidência. Sarney manteve Gervásio como fotógrafo oficial. O “Calvário” de Tancredo (a imprensa brasileira adora um clichê) durou 38 dias, mas quem carregou a cruz foram os jornalistas, principalmente aqueles dos jornais diários, numa época em que a mídia impressa ainda não fora totalmente esvaziada pela TV e pela internet. Os fechamentos dos matutinos varavam a madrugada, colocando os editores e redatores à beira de vários ataques de nervos, minando sua saúde física e emocional. Pior ainda: a primeira fase do tratamento de Tancredo foi muito mal conduzida. O Hospital de Base do Distrito Federal estava com a Unidade de Tratamento Intensivo demolida, em obras – o estado de saúde do Presidente se agravou e ele teve de ser transferido em 26 de março para o Hospital das Clínicas de São Paulo. No período em que ficou internado, Tancredo sofreu sete cirurgias, que não surtiram efeito. Em 21 de abril, o porta-voz oficial da presidência , Antônio Britto, anunciava oficialmente a morte de Tancredo Neves por infecção generalizada, aos 75 anos.

Foto de Gervásio Baptista

Foto de Gervásio Baptista

Foi justamente na transferência de Tancredo de Brasília para São Paulo que vivemos um momento crucial na cobertura da Manchete. No dia 25 de março, segunda-feira, recebemos para o fechamento da edição as primeiras fotos de Tancredo Neves desde que fora internado – seriam também as últimas fotos do Presidente em vida. Tancredo e dona Risoleta, cercados pela grande (só em tamanho) equipe médica do Hospital de Base, posaram para Gervásio Baptista, que nos mandou as fotos com exclusividade. Essa atitude foi criticada; como fotógrafo da Presidência, ele deveria disponibilizar as imagens para todos os veículos. Mas a fidelidade do bom baiano para com a Bloch reinava acima de tudo. Como editor da revista, escolhi uma foto mais fechada de Tancredo com Dona Risoleta para a capa, com a chamada TANCREDO/A VOLTA POR CIMA. Estávamos eufóricos por fazer chegar aos brasileiros, quarta-feira em todas as bancas, uma mensagem de esperança: o Presidente de bom aspecto, elegante em seu robe de seda, um foulard bem transado em volta do pescoço, e a Primeira Dama, com uma roupinha esperta, de aparência rejuvenescida, ambos sorridentes.

Uma foto diz mais do que mil palavras. Ledo e ivo engano, como diria o Cony. Às seis da manhã de terça-feira toca o telefone em minha mesinha de cabeceira. Era o chefe de reportagem, Cesarion Praxedes: “Muggiati, deu merda. O Tancredo passou mal e está sendo levado para São Paulo.” Cabeça fria, raciocinei na hora: “Cesarion, nós temos o principal que é a capa exclusiva. Liga agora mesmo pra Lucas [a gráfica da Bloch] e manda trocar a chamada de capa e o título da abertura para TANCREDO/O DRAMA DO PRESIDENTE e vamos à redação para atualizar o texto. Dito e feito.
Já a revista de informação da Bloch, a Fatos, daria na capa a chegada de Tancredo ao Hospital das Clínicas em São Paulo, aquela em que o cotovelo do padioleiro passou como sendo a cabeça do Presidente (vejam post de quarta-feira, 6 de dezembro). Aqui o grande parêntese da história. Embora sua glória maior fosse uma revista semanal ilustrada, a Manchete, a Bloch sempre ambicionou ter uma revista semanal de informação, nos moldes da Time americana. Não por acaso, a Bloch deteve os direitos para o Brasil dos textos da Time de 1973 até quase a derrocada da empresa, em 2000. Mas fazer uma revista de opinião na Bloch era uma tarefa problemática, levando em conta os comprometimentos políticos da empresa. Houve até uma primeira tentativa, nos anos 70. Como a semanal, também ilustrada, Fatos&Fotos, era o primo pobre da Manchete, Jaquito – prevalecendo-se da exclusividade dos textos da Time – incumbiu Carlos Heitor Cony, editor da F&F, da transformação pioneira. Cony, macaco velho, sabia muito bem a roubada em que ia se meter. Mas Jaquito, não tendo coisa melhor para fazer na época, resolveu insistir. Voluntariou-se até a trabalhar como chefe de reportagem do Cony e instalou-se, um estranho no ninho, na redação de F&F, vociferando um dos bordões clássicos da Bloch: “Não quero que lhe falte nada!...” Cony não teve outra opção senão entrar no jogo. Um belo dia, ordenou ao seu “chefe de reportagem”:

Jaquito, precisamos fazer urgente uma entrevista com o Paulo César Caju!
– Mas quem é Paulo César Caju? –  replicou Jaquito. E Cony, incontinenti:
– Se você, como chefe de reportagem, ignora quem é Paulo César Caju, então se considere demitido!
Jaquito, abatido, o rabo entre as pernas, foi saindo pelo corredor, quando teve um repente e voltou:
– Peraí, Cony! Você não pode demitir um dos donos da empresa. Quem está demitido é você!

Um episódio que, de todas as redações do mundo, só poderia acontecer na Bloch, à beira-mar plantada. Entre mortos e feridos, salvaram-se todos – e tudo terminou, não em pizza, mas na macunaímica feijoada das sextas no restaurante do terceiro andar à beira da piscina. A revista tipo Time da Bloch foi sepultada definitivamente quando Cony, tendo acompanhado Adolpho Bloch ao aeroporto do Galeão – o velho ia fazer uma cirurgia do coração nos Estados Unidos – disse ter lido nos olhos do Adolpho que ele não queria aquele tipo de revista...

Corte rápido. Passaram-se dez anos e, surpreendentemente, agora é o Cony quem proclama a necessidade absoluta de se criar na Bloch uma revista semanal de texto. Pragmático, acima de tudo, o nosso Cony. Em janeiro de 1985, o Colégio Eleitoral elegeu Tancredo Neves para a Presidência da República, dando fim a 21 anos de ditadura militar, com cinco presidentes fardados. As relações de Tancredo com a Bloch sempre foram as melhores possíveis e Cony viu nisso a oportunidade de capitalizar circulação e prestígio para uma revista sintonizada com o peregrino da Nova República. Adolpho não vacilou: Tancredo seria para Fatos o que JK tinha sido para a Manchete. Um clima febril tomou conta da nova redação. Ney Bianchi, escolhido como chefe da sucursal da Fatos em Brasília, logo estabeleceu suas condições: uma casa na Península dos Ministros, com um mordomo juramentado; uma polpuda verba de representação para receber políticos e autoridades; dez ternos cortados pelo melhor alfaiate de Brasília; limusine com chofer e por aí vai.

O lance maior da Fatos só não contava com as rasteiras do destino e a vulnerabilidade da carne: a revista foi às bancas na sexta-feira, 17 de março, com a foto da posse do vice José Sarney na capa; mas, sem a estrela de Tancredo, não tinha gás para ir muito longe. Vale lembrar que na época existia uma profusão de semanais de informação no Brasil, mais até do que nos Estados Unidos ou na Europa. Havia a Veja, que depois de um começo incerto em 1968, graças à estratégia de assinaturas acabou se tornando uma potência (toda grande empresa usava Veja como uma ferramenta para seus executivos); havia a IstoÉ de Mino Carta, o editor-fundador da Veja; a Visão, do empresário Henry Maksoud, que tinha seu peso; e a Afinal, que durou de 1984 a 89. Na inflação desvairada do governo Sarney, Fatos foi se arrastando – hostilizada até dentro da própria Bloch como um estranho no ninho e uma fonte de prejuízo – até fechar em julho de 1986, um ano e quatro meses depois do seu lançamento.

Quanto ao Brasil e à sua Presidência, é outra história, tão tortuosa como a da Bloch: Washington Luiz deposto, Getúlio suicidado, Jânio renunciado, Jango deposto, Tancredo morto sem assumir, Collor impedido, Dilma impedida e Temer isso que todos estão vendo aí...

Só resta fechar com o humor mineiro do velho Tancredo Never: certa vez, numa roda de amigos no Senado, ele definiu seu epitáfio, que não chegou a ser gravado na lápide do cemitério ao lado da Igreja de São Francisco de Assis, em São João del-Rei:

“Aqui jaz, muito a contragosto, Tancredo de Almeida Neves!”

(*) O diretor Sérgio Rezende lançará no dia 14 de junho de 2018, o filme O Paciente, que focaliza os últimos dias de Tancredo. O ator Othon Bastos representará o político mineiro. 

Você pode defender o meio ambiente com pequenas atitudes. Conheça o Guia da Pessoa Preguiçosa para salvar o mundo





O Centro de Informação das Nações Unidas (UNIC Rio) lança neste dia 10 de dezembro (Dia Internacional dos Direitos Humanos) a campanha digital ‘Guia do Preguiçoso para Salvar o Mundo’. São 42 dicas ilustradas de pequenas atitudes que contribuem para  o desenvolvimento sustentável. A UNIC Rio lembra que os direitos humanos não são unicamente políticos ou civis, mas também econômicos, sociais, culturais e a cada dia mais ambientais.

O Guia do Preguiçoso dá dicas simples para a participação de cada um. Alguns exemplos: pagar as contas online e cancelar extratos bancários em papel evita a destruição de florestas. Apagar as luzes – inclusive da sala, se a iluminação da TV ou do computador forem suficientes – economiza energia. Comprar produtos que usem pouca embalagem. Reaproveitar a água da chuva para limpar calçadas e regar plantas. Comprar em lojas de segunda mão: produtos novos não são necessariamente melhores.A campanha entra no ar das redes da ONU Brasil a partir de 10 de dezembro.

Fonte: Centro de Informação das Nações Unidas para o Brasil 

Jornalismo - Não passou da hora de sair da "bolha"?

Que os políticos, em Brasília, vivem em um universo encantado de benefícios, mordomias e modos de vida à parte, nós sabemos. Quando nos deparamos com aqueles sujeitos engravatados, a grande maioria deles, dando declarações apressadas à saída do Congresso temos a sensação clara de que são marcianos ou não estão no pleno uso das suas faculdades mentais. Mas quando dão entrevistas longas em programas de TV que tentam entendê-los a coisa fica muito pior. Quando têm tempo para elaborar ideias e análises sem links com a vida real aqui em baixo, aí temos certeza de que vivem um mundo bizarro e paralelo. 

Quem trabalha, toma um cafezinho com os colegas, anda de metrô, conversa com o vizinho, vai ao clube, à academia, paga contas e vai ao supermercado não sabe do que aqueles caras estão falando. Da rotina de um trabalhador honesto não é, de um jovem que busca uma vaga no mercado de trabalho também não, de um idoso que espera atendimento em um hospital público, passa longe.

Ok, somos invisíveis para os políticos. Mas será que somos vistos e ouvidos pela grande mídia?

Se o padrão do jornalismo é reproduzir fontes oficiais explícitas ou disfarçadas de "um interlocutor do ministro...", se a "verdade" está apenas com o economista do "mercado", com a Fiesp, com o círculo de autoridades suspeitas que cerca um presidente igualmente suspeito e com o "consultor" da agroindústria ou com o enviado do Banco Mundial, há que duvidar.

Geralmente, a mídia dominante, por absoluta afinidade, reproduz o mundo irreal que os políticos habitam. Será que não cabe aos jornalistas tentar quebrar o padrão, alternar ângulos e pontos de vista, buscar o contraditório, duvidar, apurar que o buraco é mais em baixo?

A notícia filtrada pelos jogos vorazes dos mesmos e eternos personagens, não apenas os políticos, mas os "analistas" e "especialistas" com opiniões previamente aprovadas, uma espécie de "análise" de carta marcada que nunca surpreende, deixa de ser notícia, transforma-se em peça de divulgação de interesses ou de campanha paragovernamental, como se viu no caso da reforma trabalhista e, agora, no encaminhamento da reforma da Previdência. E se vê na cobertura da Lava Jato onde o "jornalismo" se alimenta apenas de comunicados oficiais ou de vazamentos. O que é cômodo, mas não é jornalismo. Para a grande mídia, a "fonte" é utilizada quase sempre para reforçar ou "autenticar" a versão politicamente oficial. Se os repórteres do Washington Post se limitassem a veicular a palavra oficial e os vazamentos controlados da Casa Branca, Watergate seria até hoje um endereço e não um escândalo que levou à renúncia de um presidente. 

O repórter gaúcho Carlos Wagner, com sete prêmios Esso regionais nas costas, 31 anos de carreira no Zero Hora, ex-Coojornal, o veículo da famosa Cooperativa de Jornalistas de Porto Alegre que foi uma voz corajosa contra a ditadura nos anos 1970, levanta a questão do jornalista que gira em torno de si em um artigo publicado no seu blog. Leia abaixo:

  

Para ler a matéria completa, clique AQUI


Fotógrafo Iaponã, que vive em Fernando de Noronha, expõe no Rio a intimidade da Ilha...

Paloma Bernardi. Foto Iaponã/Divulgação

Em cartaz na Cidades das Artes, na Barra da Tijuca, a exposição "Neuronhe-se", com o trabalho do fotógrafo Rildo Iaponã, pernambucano residente em Fernando de Noronha.
Iaponã fotografou atores e atrizes que há anos adotam a ilha como destino de folgas e férias.

Fabiula Nascimento. Foto Iaponã/Divulgação

Entre os fotografados, Paloma Bernardi, Carol Castro, Fabiula Nascimento e Paulinho Vilhena, que participa, junto com Iaponã,  do projeto social "Casa Neuronha" que apoia jovens locais, faz campanha educativas sobre preservação da natureza e promoveu, recentemente, doação de óculos de grau para habitantes de Noronha.Iaponã revela uma face da Ilha tão natural quanto o seu belo ecossistema.

quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

Posto de Escuta - Em alta ansiedade, o Brasil é um filme de Mel Brooks

por O.V.Pochê 

O Brasil precisa de ajuda psiquiátrica. A simples leitura dos jornais, a qualquer dia ou hora, vale por um diagnóstico. Já que a casta dirigente tem tantos privilégios, não custa incluir mais um: remédio traja preta de graça e para todos no café da manhã. Vai ver funciona. Confira o desvario da semana.

* O deputado Tiririca (segundo o dicionário, nome de uma planta daninha e também adjetivo que se dá a pessoas coléricas, furiosas) passou sete anos na Câmara dos Deputados em estado de catatonia política. Fez um primeiro e último discurso, ontem. De despedida. E saiu titirica. Decepcionado, vai deixar a política. Devia devolver os salários.

* A Istoé faz a festa da premiação Os Brasileiros do Ano, onde autoridades e réus dividiram a mesa e brindaram alegremente.

* Rogério 157 e preso e o primeiro procedimento da polícia é posar para selfies sorridentes com o preso.

* Um levantamento da Consultoria Legislativa do Senado, feito a pedido do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), demonstra que autoridades do Poder Judiciário, Ministério Público e Tribunais de Contas da União, dos estados e do Distrito Federal gastam R$ 1,6 bilhão anuais com auxílio moradia. Não dá para confiar em autoridades que não têm capacidade nem de pagar suas próprias contas. O auxílio moradia desse imenso bloco de marajás é de mais de 4 mil reais mensais, sendo que a maioria, apesar do mensalão oficial, mora em... casa própria. Randolfo apresentou Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para acabar com o exótico jabá residencial. Essa PEC vai ganhar auxílio moradia eterno nas gavetas do Senado.,.

* Pesquisa do Datafolha apurou que 60% dos brasileiros considera ruim ou péssimo o trabalho dos parlamentares. É a imagem do Congresso no buraco mais fundo desde 1993.

* Temer está sendo criticado por não ter comprado deputados na Black Friday. Economizaria dinheiro público na promoção.

* Perdeu, mamãe. Depois que um delator revelou que Geddel guardava dinheiro de propina no closet da mama e o Globo mostrou que dona Marluce controla os negócios da família e mantém os filhos em coleira curta, o clima ficou complicado para a matriarca baiana. Piorou mais ainda agora com a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, afirmando que a mama "tem papel ativo e relevante na lavagem de dinheiro". O acarajé de dona Marluce está assando...

* Vale-transporte: empresas de ônibus pagaram R$250 milhões a políticos do Rio de Janeiro. Dinheiro que, claro, saiu do preço da passagem que o carioca paga.

* Sem contar o PCC, quem mais ganhou dinheiro este ano foram as  distribuidoras de gás. Com a nova política de preços imposta por Temer para ficar de bem como mercado, o gás aumentou 84% só esse ano.

* Governo Temer rouba bordão de Sílvio Luís. Propaganda federal surrupiou a famosa expressão "Olho no lance" criada pelo locutor esportivo. Silvio reclamou pelo twitter: "Sou roubado pelo Governo até no meu bordão, nem licença pediram". O Planalto se apropriou do bordão para campanhas sobre PIB, alta da Bolsa, aumento de emprego e outras manipulações.


Suas conversas podem ter sido gravadas. Mas Joesley Batista e Moro não têm nada a ver com isso...

Sabia disso? Não apenas Joesley Batista, a força-tarefa do MPF e a onipresente NSA americana gravam conversas adoidado. O Google também pode fazer um tape básico dos seus papos. A informação está no Blue Bus, como dica da Shortlist, e pode ser útil para você. Para ouvir todas as gravações que o buscador eventualmente terá feito das suas pesquisas por voz e até de conversas aleatórias basta acessar na página da sua conta do Google, a seção ‘My Activity’ e selecionar ‘Voice & Audio’. Veja mais detalhes no Blue Bus, AQUI. 

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Lição grátis de jornalismo: cotovelos em capas sempre dão problema...

Reprodução Mashable

por José Esmeraldo Gonçalves 

A Time divulgou sua tradicional capa de "Pessoa 2017": é dedicada às mulheres que quebraram o silêncio e revelaram casos de assédios sexuais. Para representar a reação feminina aos abusos, a revista reuniu Ashley Judd, Taylor Swift, Susan Fowler, Adama Iwu e Isabel Pascual, cujo nome foi alterado para proteger sua identidade.

Mas o que está intrigando os leitores é o cotovelo aparentemente aleatório que aparece no canto direito da capa. A informação é do Mashable.

O editor do TIME, Edward Felsenthal, diz que o detalhe simboliza mulheres e homens que ainda estão calados e no anonimato diante das violências que sofreram.

Mas nas redes sociais também há quem especule que o cotovelo fantasma pode ter sido uma falha no corte da foto.

O DIA EM QUE A REVISTA FATOS CONFUNDIU 
O COTOVELO DE UM ENFERMEIRO COM 
A CABEÇA DE TANCREDO NEVES


O cotovelo da Time remete a um certo cotovelo na revista Fatos, em 1985. Como todas as redações do país, a Fatos estava mergulhada até o pescoço na exaustiva cobertura da agonia de Tancredo Neves, que durou mais de um mês.

A cada fechamento, a revista atualizava em texto e fotos a luta dos médicos para salvar o presidente eleito, mas semana após semana corria o risco de chegar às bancas 48 horas depois - tempo gasto em preparação e impressão - desatualizada e com Tancredo Neves já morto.

Em um desses complicados fechamentos, quase no minuto final, chegam de Brasília fotos que  mostrariam o presidente eleito, deitado em uma maca, a caminho da ambulância que o levaria em emergência ao aeroporto de onde seguiria para São Paulo. A foto da inesperada transferência do paciente era a mais atual e exclusiva, segundo Brasília. Apenas o fotógrafo da Fatos havia invadido o acesso à garagem do Hospital de Base e obtido um ângulo favorável. Claro, iria para a capa.

Já era quase meia-noite quando a redação inteira, já exausta, foi para a sala de projeção participar da escolha da melhor imagem da sequência da maca. Decepção total: nenhuma foto mostrava o rosto ou sequer a cabeça de Tancredo. A cena era muito confusa, médicos, enfermeiros e policiais cercavam o paciente. Mas a projeção de slides continuava, as fotos eram vistas e revistas. Em vão. A redação já estava quase desistindo de trocar a capa paginada antes quando uma voz não identificada, em plena escuridão da cabine de projeção, quebrou o silêncio e decretou:

- Olha a cabecinha dele ali, gente!
- Que cabecinha? - alguém duvidou.
- Ali - insistiu a voz -, no canto, a carequinha dele e um travesseiro!

Deu-se então um caso típico de alucinação coletiva, quase uma hipnose. A partir do momento em que a voz viu Tancredo, todos na cabine também tiveram a mesma visão. Era aquilo mesmo, lá estava a cabecinha de Tancredo. Como a foto era confusa, alguém sugeriu que a Arte fizesse um círculo vermelho em torno da tal carequinha para que os leitores identificassem mais rapidamente o que a redação levou mais de uma hora para perceber. E assim foi feito.

Fechamento concluído, todos foram para casa.

Um dia e meio depois, a revista impressa foi colocada na mesa do diretor. A capa estava perfeita, as chamadas idem. Só tinha um problema. O círculo vermelho não destacava nada que parecesse a cabecinha de Tancredo. Até porque não havia cabecinha coisa nenhuma. O que a capa mostrava claramente era o cotovelo de um dos enfermeiros, um cara tão parrudo que de fato a popular conexão do braco com o antebraço parecia mesmo um cabeção.

J.A. Barros, diretor de Arte da Fatos, colaborador deste blogé testemunha daquela noite fatídica. É justo dizer que ele foi um dos mais resistentes a acreditar que via a ilustre cabecinha do presidente eleito. Mas, como todos os demais zumbis que passaram mais de um hora naquela sala de projeção, ele também foi induzido a ver a luz: a foto exclusiva de Tancredo na maca.

A cabecinha de Tancredo que dez ou doze pessoas viram naquela noite mística no escurinho da cabine tinha sido apenas produto de uma ocasional alucinação coletiva. Mas rendeu capa!.

Vem aí a reforma trabalhista robótica. Até 2030, robôs vão tomar até 800 milhões de empregos no mundo

A consultoria McKinsey Global Institute publica um relatório com uma conclusão nem um pouco animadora: até 2030, de 400 a 800 milhões de pessoas em todo o mundo perderão seus empregos para robôs.
Os países desenvolvidos sofrerão o impacto maior. Por causa dos baixos salários, nações em  desenvolvimento vão demorar um pouco mais a trocar grande parte da mão-de-obra por máquinas ou androides inteligentes, mas serão afetadas mesmo assim. Operadores de máquinas e balconistas estão entre as categorias mais prejudicadas. Funções que exigem muita especialização, interação social e emocional vão resistir mais à automatização.
No cinema e nas histórias em quadrinhos, os robôs são quase sempre personagens gente boa. Essa imagem simpática vai mudar no momento em que você sair para tomar um cafezinho e ao voltar encontra um robô no seu lugar.

Caso Profumo visto pelo jornalista Roberto Muggiati, que morava em Londres nos dias em que uma showgirl derrubou um ministro e abalou a Corte

Roberto Muggiati, que estava em Londres na época em que estourou o Caso Profumo, publicou na revista The Presidente N° 14, set/out/nov 2013, da Custom Editora
a matéria que reproduzimos abaixo, em sequência à notícia da morte de Christine Keller, ontem, em Londres. A modelo e showgirl foi pivô do escândalo e musa da Guerra Fria nos anos1960.
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Clique nas imagens para ampliar ou leia o texto a seguir:




HISTÓRIA

POR ROBERTO MUGGIATI

ILUSTRAÇÃO GUILHERME FREITAS

1963

O CASO PROFUMO

Sexo, drogas e espionagem: 

havia algo de podre no Reino (des) Unido 

No Brasil, tudo acaba em pizza. Na Inglaterra, os 
criminosos são punidos. Mas, às vezes, acabam 
em espetáculo (lembram o superladrão Ronald 
Biggs, que virou superstar e veio morar no Brasil?). 
É o caso agora de Stephen Ward, pivô do 
Escândalo Profumo. Há 50 anos, ele escapou à 
punição suicidando-se. Hoje, com aura de mártir, volta aos refletores 
em Stephen Ward The Musical, assinado por Andrew Lloyd Weber, o 
criador de Jesus Cristo Superstar, Evita e O Fantasma da Ópera.

Resumo da história: em julho de 1961, numa festa na casa de 
campo de um lorde, o ministro da guerra britânico, John Profumo, foi 
apresentado à dançarina Christine Keeler, de 19 anos. Casado com 
a atriz de cinema Valerie Hobson, Profumo, 46 
anos, era um político em ascensão no partido 
conservador. O famoso osteopata e pintor Stephen 
Ward (retratou o Duque de Edimburgo 
e o Duque e a Duquesa de Kent), 48 anos, foi 
quem apresentou Christine a Profumo. Ward 
também apresentou Christine, sua amiga, a 
Eugene Ivanov, adido naval da URSS em Londres. 
Na verdade, Christine era uma garota 
de programa; Stephen Ward, um proxeneta; 
Ivanov, um espião da KGB – e Profumo, um 
grande otário. O ministro em poucas semanas 
se deu conta do risco da situação e rompeu com 
Christine, mas o estrago já havia sido feito. 

Quase dois anos depois, um problema de 
Christine com a justiça trouxe o caso à tona. E 
estourou nos jornais. "WAR MINISTER SHOCK" foi uma das primeiras 
manchetes. O escândalo – em que um ministro britânico (justo 
o da guerra) e um espião soviético dividiam a cama com a mesma 
mulher – acontecia num momento nevrálgico da Guerra Fria, pouco 
depois da Crise dos Mísseis de Cuba, em que Kennedy e Kruschev 
quase desencadearam o holocausto nuclear. (No imaginário popular, 
ocorria o boom de James Bond, com o primeiro filme da série em 
cartaz, O Satânico Dr. No) Em março de 1963, Profumo declarou reservadamente 
à Câmara dos Comuns que “não houve nenhuma impropriedade” 
em suas relações com Christine Keeler. Em 5 de junho, ele 
voltou atrás e admitiu que havia mentido. Renunciou ao ministério, 
à cadeira no Parlamento e ao seu posto no Conselho Privado. Graças 
ao Caso Profumo, os conservadores perderam o gabinete para 
os trabalhistas nas eleições do ano seguinte e entrou em cena, como 
primeiro-ministro, Harold Wilson, aquele cinquentão sorridente 
que tirava fotos de cachimbo na boca com os Beatles.

RELATÓRIO BEST-SELLER

Publicado em 25 de setembro de 1963 pela imprensa oficial de 
Sua Majestade, o relatório oficial de Lord Denning tornou-se um 
best-seller: vendeu mais de 100.000 exemplares, sendo 4.000 na primeira 
hora. Saiu na íntegra como suplemento do Daily Telegraph e foi 
descrito pela BBC, em 1999, como “o mais picante e deleitável relatório 
oficial já publicado.” Eu morava em Londres na época (veja box) e 
também engrossei a imensa fila diante de Her Majesty’s Stationery 
Office para comprar o meu. Está meio desbotado, 
com a lombada um pouco avariada e as folhas 
amareladas, mas ainda rende ótima leitura. Vou 
compactar alguns trechos. Lorde Denning descreve 
admiravelmente os personagens:

• “A história tem de começar com Stephen 
Ward, 50 anos. Filho de um clérigo, era osteopata 
com consultórios em 38, Devonshire Street, W1. 
Muito competente, tinha pacientes famosos. Era 
também um talentoso pintor de retratos e pessoas 
importantes posaram para ele. Sua conversa rápida 
e fácil atraia muita gente, mas repelia outros. Gostava 
de conhecer ocupantes de altos postos. Era, ao 
mesmo tempo, extremamente imoral. Costumava 
atrair garotas bonitas de 16 ou 17 anos, geralmente 
de boates – seduziu muitas delas – e as fazia amantes 
de seus amigos influentes. Atendia também a amigos com gostos 
pervertidos, promovendo açoitamentos e outras cenas de sadismo. 
Participava de festas com orgias sexuais revoltantes. Finalmente, 
admirava o regime soviético e simpatizava com os comunistas. Ficou 
muito amigo de um russo, Eugene Ivanov.”

• “O capitão Eugene Ivanov era adido naval assistente na embaixada 
da Rússia em Londres, um posto apenas diplomático. Chegou 
ao país em 27 de março de 1960, mas o Serviço de Segurança descobriu 
que era também um oficial da inteligência russa. Seu inglês era 
razoável e podia conversar com facilidade. Mas bebia bastante e era 
mulherengo. Impressionava-se com pessoas da aristocracia. Não 
perdia tempo em defender o lado russo. Avisava logo seus interlocutores: 
'Tudo o que vocês disserem vai direto para Moscou. Meçam 
suas palavras.' Stephen Ward e o capitão Ivanov se tornaram grandes 
amigos. Iam a restaurantes, jogavam bridge, encontravam amigos e 
garotas. Ivanov preenchia um novo papel na técnica russa: dividir o 
Reino Unido dos Estados Unidos, desmoralizando ministros ou altos 
funcionários para que o serviço secreto britânico parecesse incompetente. 
Se esse era o alvo do capitão Ivanov, tendo Stephen Ward como 
seu instrumento, ele foi muito bem sucedido.”

• “Christine Keeler, com 21 anos, saiu de casa aos 16 e logo se 
empregou num cabaré de Londres onde seu trabalho era caminhar 
pelo palco sem roupas. Stephen Ward a conheceu e a convidou para 
morar em sua casa. Ele a apresentava a homens influentes com os 
quais ela mantinha relações sexuais. Christine tinha indubitáveis 
atrativos físicos.”

• “O Sr. Profumo foi ministro da guerra de julho de 1960 a junho 
de 1963. Aos 48 anos, tem uma inestimável folha de serviços ao país. 
Quaisquer indiscrições que tenha cometido e quaisquer falsidades que 
tenha contado, nenhum depoente que ouvi deu provas de duvidar da 
sua lealdade. O Sr. Profumo casou-se em 1954 com a Srta. Valerie Hobson, 
atriz talentosa, e o apoio que ela lhe deu em seus dias difíceis é um 
dos aspectos mais redentores nos acontecimentos que vou descrever.”

• “Lorde Astor conheceu Stephen Ward em 1950 quando o procurou 
como paciente depois de um tombo durante uma caçada. Em 
1956 Lorde Astor alugou a Ward um chalé na sua propriedade de Cliveden.” 
(No fim de semana de 8 e 9 de julho de 1961 os convidados 
de Lorde Astor se encontraram com as convidadas de Stephen Ward 
na piscina da propriedade. Foi quando Profumo conheceu Christine 
Keeler.) “Todos estavam em roupas de banho, mas nada indecente 
aconteceu. O capitão Ivanov deixou Cliveden no começo da noite de 
domingo e deu carona para Christine. Foram para a casa de Stephen 
Ward e lá beberam bastante e houve algum tipo de relação sexual. 
Mas o capitão Ivanov nunca se tornou amante de Christine. Aparentemente, 
durante aquele fim de semana o Sr. Profumo se sentiu muito 
atraído por Christine Keeler. Nos dias seguintes, marcou encontros 
com ela, visitou-a na casa de Stephen Ward e teve relação com ela 
lá. Certa vez, a levou a passear em um carro do ministério. Em agosto, 
quando sua mulher estava na Ilha de Wight, ele levou Christine para 
sua própria casa, em Regent’s Park. Um dos pontos mais críticos da 
minha investigação é este: teria Stephen Ward pedido a Christine 
Keeler para obter do Sr. Profumo informação sobre quando os norte-
americanos forneceriam a bomba atômica para a Alemanha? Ninguém 
em sã consciência teria pedido a alguém como Christine Keeler 
que obtivesse esse tipo de informação do Sr. Profumo.”

A inteligência britânica acompanhava os passos do ministro da 
guerra e sabia de tudo. O secretário do gabinete aconselhou Profumo 
a terminar a relação e ele o fez numa carta para Christine em 9 de 
agosto de 1961. Tudo teria ficado em silêncio não fosse um traficante, 
amante de Christine, ter arrombado sua porta a tiros e levado a call girl 
para os tribunais e as manchetes.

CHRISTINE FALA

Passados 50 anos, a própria Christine desmente o Relatório Denning. 
Em entrevista ao Daily Mirror (9 de junho de 2013), ela admite 
que foi manipulada pelo médico para trair seu país. Disse que Ward 
usou o primeiro encontro na sua casa entre ela e “Jack” para roubar 
documentos secretos da pasta do ministro detalhando a entrega de 
armas nucleares à Alemanha. “Profumo nunca revelou que teve cartas 
secretas roubadas, por arrogância, incompetência ou para esconder 
sua negligência.” Christine contou ainda ao Mirror: “Não lembro 
bem como era fazer sexo com Jack, a não ser que foi furtivo no começo, 
depois se tornou cada vez mais prazeroso e subitamente acabou. 
Parece incrível que nossa relação tenha resultado em tanta tragédia 
e tanto dano.” Ela se diz uma inocente útil, enganada por Ward. “Fui 
recrutada por um homem esperto e carismático, mas perigoso.” Conta 
que foi a encontros com espiões infiltrados no próprio establishment, 
como Sir Anthony Blunt (curador dos museus reais), Sir Roger Hollis 
(chefe do MI5) e outros: “Podem imaginar como era chato para mim 
ficar ouvindo toda aquela conversa sobre Moscou, Washington e 
bombas nucleares?”

No rastro do escândalo, o michê de Christine Keeler subiu astronomicamente. 
Ela foi para a cama com bonitões do cinema como 
Warren Beatty, George Peppard, Maximilian Schell e os veteranos 
Robert Mitchum e Douglas Fairbanks Jr. Costumava circular na noite 
com sua amiga Mandy Rice-Davis, 19 anos, que também se envolveu 
no escândalo. Ficou famosa por uma frase, no tribunal, quando 
lhe disseram que Lorde Astor negara qualquer relação com ela: “He 
would, wouldn’t he?” (“Ele falou, não foi?”) A frase entrou na 3ª edição 
do Oxford Dictionary of Quotations (1979). Em 1983, Christine 
publicou uma autobiografia, Nothing But. Na época vendia telefones 
em Fulham, depois gerenciou uma lavanderia em Battersea. Na década 
de 1990, foi morar no litoral sul da Inglaterra e trabalhou como 
cozinheira numa escola de moças. Em 2001 ainda tinha o que contar 
e lançou uma segunda autobiografia, The Truth at Last. 

Peter Wright, agente da contrainteligência britânica MI5, interrogou 
longamente Christine sobre o Caso Profumo. Em sua autobiografia, 
Spycatcher (Caçador de espiões, Bertrand-Brasil, 1988), 
ele disse que se surpreendeu ao ver uma garota de programa inculta 
usar o termo nuclear payload (carga útil nuclear) referindo-se 
a mísseis. Christine foi imortalizada pela foto icônica do australiano 
Lewis Morley, feita em maio de 1963, em que aparece nua, 
escanchada numa cadeira do designer dinamarquês Arne Jacobsen. 
Tanto a cadeira como a foto entraram para o acervo do Victoria 
& Albert Museum de Londres. Uma frase atribuída a Christine 
também ficou célebre: “Eu assumi os pecados de todo mundo, de 
toda uma geração, na verdade.”

PSICODRAMA

Um filme britânico sobre o Caso Profumo foi lançado em 1989, 
Scandal, dirigido por Michael Caton-Jones e estrelado por Joanne 
Whalley (Christine Keeler), John Hurt (Stephen Ward), Ian McKellen 
(John Profumo), Britt Ekland (Mariella Novotny) e Bridget Fonda 
(Mandy Rice-Davies). Um destaque do filme foi a canção Nothing Has 
Been Proved, composta e produzida pelos Pet Shop Boys e cantada por 
Dusty Springfield. John Dennis Profumo, o 5º Barão 
Profumo do Reino da Sardenha, depois da 
renúncia prestou serviços voluntários limpando 
latrinas em Toynbee Hall, uma instituição 
de caridade no East End, a zona mais pobre 
de Londres. (Lembra o fim de Jeremy Irons 
em Perdas e danos). Com o tempo, 
tornou-se o principal angariador de fundos da instituição e conseguiu restaurar em parte sua reputação. 
Trabalhou lá até morrer em 2006, aos 91 anos. Sua mulher, 
Valerie Hobson, interrompeu uma brilhante carreira de atriz em 1954 
ao casar com Profumo. Seu último filme, o 45º, foi Um Amante Sob Medida, 
dirigido por René Clément e estrelado pelo galã Gérard Phillipe. 

Morreu em 1998 aos 81 anos. 

A vida de Stephen Ward tem tudo para dar um belo musical. Foi 
médico, entre outros, de Winston Churchill, Frank Sinatra e Elizabeth 
Taylor. Na Segunda Guerra, na Índia, o capitão Ward tratou o 
Mahatma Gandhi de dores de cabeça e da coluna cervical. Aos 17 
anos rompeu com a família e foi para Londres. Vendeu tapetes, baús 
de chá indianos, assinaturas da revista The Spectator e foi tradutor da 
Shell em Hamburgo. Em 1934, aos 22 anos, a mãe o persuadiu a estudar 
medicina. Formou-se no Kirksville College of Ostheopathy and 
Surgery no Missouri, nos Estados Unidos. Segundo o jornalista Philip 
Knightley, “Ward ajudou a dar à luz bebês em fazendas remotas, 
praticou cirurgias em mesas de cozinha, cuidou de ossos quebrados 
em tornados e ministrou injeções contra a febre tifoide durante as 
enchentes que devastaram a junção dos rios Ohio e Mississipi.” 

Stephen Ward não resistiu às pressões do Caso Profumo e 
envenenou-se com barbitúricos. Estava em coma quando recebeu 
o veredicto de culpado da acusação de viver de “ganhos imorais” 
ao prostituir suas amigas Christine Keeler e Mandy Rice-Davies. 
Morreu três dias depois da sentença, em 3 de agosto de 1963. O Caso 
Profumo foi o divisor-de-águas entre a velha e a nova Inglaterra. 
Como registrou em março de 1963 a revista Time: “Na ilha onde o 
tema era há muito tempo tabu entre a sociedade educada, o sexo explodiu 
na consciência nacional e nas manchetes. ‘Estamos virando 
maníacos sexuais?’ pergunta o Daily Herald. ‘A castidade está fora de 
moda?’ pergunta uma revista escolar para adolescentes. ‘As virgens 
ficaram obsoletas?’ é a pergunta feita pelo solene New Statesman. As 
respostas variam, mas uma coisa é clara: a Grã-Bretanha está sendo 
bombardeada por uma barragem de franqueza em relação ao sexo.” 

O Caso Profumo foi também o grande psicodrama da Guerra 
Fria, uma tragédia que Shakespeare teria escrito se vivesse nos anos 
1960. A partir do dia 3 de dezembro, esta história será revivida todas 
as noites no palco do Aldwych Theatre, em Londres. E – quem sabe 
no ano que vem? – nos melhores teatros de Rio e São Paulo.

MEMENTO

Embalos de sábado à noite em Londres, 3 de agosto de 1963,
morei em Londres de agosto de 1962 a junho de 1965, trabalhando 
no Serviço Brasileiro da BBC). Eu bebia num pub de Chelsea bem 
próximo ao hospital St. Stephen’s, onde o médico Stephen Ward, o 
agente catártico do Caso Profumo, estava em coma depois de uma 
tentativa de suicídio. O escândalo ocupava todo dia as manchetes. 
Lembro bem daquela noite por causa de uma quadrinha rabiscada na 
parede do banheiro do pub, que nunca mais esqueci: “L’ha detto Dante/ 
lo confermó Petrarca/ la fica di una donna/ ha la forma di uma barca.”(Já 
disse Dante/ e confirmou Petrarca/ a xota de uma dona/ tem a forma de 
uma barca.) No domingo, acordei de ressaca. Ao sair às ruas aturdido, 
vi os cartazes das bancas de jornais berrando: Stephen Ward tinha 
morrido naquela noite. 



A "guerra fria" esquenta na mídia...

Em resposta aos Estados Unidos, que retiraram as credenciais do canal de TV russo RT, declarando-o como "agente estrangeiro", a Rússia enquadrou nove meios de comunicação dos EUA  igualmente como "órgãos que exercem funções de um agente estrangeiro". Ambas as medidas não impedem mas limitam a atuação dos repórteres. A Rússia considerou a cassação de credenciais como um ato hostil e contrário à liberdade de expressão. As novas regras foram impostas pelo Congresso americano onde republicanos, muitos deles 'falcões", são ampla maioria.

Vandalismo...

Foto de Alexandre Macieira/Riotur

Por que não botam lentes de contato no Drummond?

Christine Keller: a musa da Guerra Fria morre em Londres e deixa uma foto e uma cadeira que entraram para a história dos escândalos políticos...

Foto do site oficial de Lewis Morley. (link abaixo)

por Jean-Paul Lagarride 

Christine Keller morreu ontem, em Locksbottom, perto de Londres, aos 75. Antes de três gerações clicarem no Google, segue um who's who: a moça foi a musa da Guerra Fria.

Para usar uma expressão atual a modelo e showgirl ganhou status de protagonista do primeiro escândalo político-sexual a 'viralizar" como um raio na mídia mundial.

No fim dos anos 1950, o videotape já globalizava programas das TVs dos grandes centros, mas em 1962 o satélite Telstar transmitiu pela primeira vez imagens ao vivo dos Estados Unidos para a Europa. A nova tecnologia, somada ao avanço das redes terrestres de microondas, criou os primeiros links da aldeia global.

Em 1961, Christine Keller foi a uma balada sem lei em uma mansão com piscina e lá conheceu John Profumo, ministro da Guerra do governo de Harold McMillan, com quem passou a ter um caso.

Simultaneamente , Keller se envolveu com o adido da marinha soviética em Londres,Yevgeny Ivanov. Assim, em plena Guerra Fria, a garota passou a ter na sua cama duas potências, pelo menos no sentido geopolítico, no tempo em que a espionagem ainda guardava certo romantismo. A showgirl tornou-se o elo desejado entre o comunismo e o capitalismo.

Quando o triângulo foi descoberto, já em 1963, Profumo negou inicialmente qualquer envolvimento com Keller. Depois, pressionado, Profumo confessou, renunciou ao cargo - embora não se tenha provado que na hora do vamos-ver o ministro tenha trocado segredos de Estado com Keller e esta tenha repassado informações para Ivanov - e abandonou a política. O político morreu em 2006, depois de trabalhar durante anos em uma estação de tratamento de esgotos.

No Daily Express e...

...no Correio da Manhã
Christine tornou-se "celebridade" e, se não virou uma Kim Kardashian por falta de redes sociais,  aproveitou bem a fama. Suas fotos mais famosas não são selfies, mas um belo ensaio assinado pelo fotógrafo Lewis Morley.

Christine Keller posou nua, fez uma série de poses, mas a cena que entrou para a história mostra a musa da Guerra Fria sentada em uma cadeira. E essa foi a foto de Morley que percorreu o mundo e virou o logotipo do escândalo. Christine ficou conhecida de Xangai a Madureira e, por tabela, até a cadeira - criada pela designer Arne Jacobsen virou um must e está hoje no Victoria &Albert Museum.

A Guerra Fria, em nova versão, voltou ao noticiário, mas ainda não tem uma Christine Keller para chamar de sua.


Conheça o site e o trabalho do Lewis Morley, falecido em 2013, na Austrália. Ele foi o autor das fotos que globalizaram a jovem que abalou Londres nos anos 1960.

Clique AQUI